
Após meses de luta, o grupo extremista autodenominado Estado Islâmico (EI, ou ISIS na sigla em inglês) perdeu recentemente o controle sobre Baghuz, uma aldeia no leste da Síria que simbolizou o último capítulo da história de seu autointitulado califado.
Ainda que a perda do pequeno enclave perto da fronteira iraquiana tenha sido um grande revés, ela não significa, porém, a completa desmobilização do EI.
O grupo e seus afiliados seguem ativos em vários países e, por meio de seus canais de propaganda online, continuam declarando autoria de atentados em diversas partes.
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Dados coletados pela BBC Monitoring mostram que, apesar de ter perdido a maior parte de seu território na Síria e no Iraque no final de 2017, o Estado Islâmico reivindicou participação em 3.670 ataques em todo o mundo no ano passado – uma média de 11 por dia – e de 502 nos dois primeiros meses de 2019, enquanto Baghuz estava sob cerco.
A análise mostra ainda que houve um pico em setembro de 2018, provavelmente ligado a uma operação da aliança das Forças Democráticas Sírias (SDF) no início daquele mês, apoiada pelos EUA, para tomar o bastião de Hajin, ao norte de Baghuz.
O grupo jihadista geralmente intensifica seus ataques em resposta a ofensivas, seja na área sob cerco ou em outro lugar, para desviar a atenção ou os recursos para longe de seu território.
Embora Iraque e Síria continuem a responder pela maior parte dos ataques reivindicados pelo EI, Afeganistão, Somália, Filipinas, Nigéria e a península egípcia do Sinai também aparecem regularmente nos registros.
Em uma mensagem recente, a liderança do Estado Islâmico ridicularizou a declaração dada em dezembro pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de que o grupo havia sido derrotado.
O modelo de califado do EI, entretanto, de fato chegou ao fim no final de 2017, quando o grupo perdeu as fortalezas de Mossul, no Iraque, e Raqqa, na Síria.
Como os dados sobre a atividade do EI foram coletados
Os dados se baseiam exclusivamente no que o próprio grupo reivindicou através da Nashir News Agency, uma espécie de “agência de notícas” do EI, no aplicativo de mensagens Telegram. O registro temporal se refere à data informada dos ataques, e não ao momento em que a suposta autoria foi divulgada.
A maioria dos ataques reivindicados exclusivamente por meio do jornal semanal al-Naba, também vinculado ao grupo, sem outra declaração separada não foi considerada. Isso porque, como qualquer grupo jihadista, o EI tende a exagerar a escala de seus ataques e seu impacto.
O grupo declarou estar presente nos seguintes países e regiões: Iraque, Síria, Líbia, Egito, Iêmen, Arábia Saudita, Argélia, “Khorasan” (região Afeganistão-Paquistão), “Cáucaso”, “Ásia Oriental” (especialmente nas Filipinas), Somália e “África Ocidental” (especialmente na Nigéria).
Alguns desses ramos, como os que atuam na Argélia e na Arábia Saudita, quase não registraram atividade.
O EI recentemente sinalizou via propaganda sua intenção de aumentar a presença na Tunísia, país onde até agora não conseguiu avanços após os ataques de 2015 contra um museu e uma estância turística. Em março, anunciou pela primeira vez atividade em Burkina Faso – país onde sua rival Al-Qaeda já realizou vários ataques.
Os anúncios sobre esses dois países sugerem que, pelo menos em termos de propaganda, o grupo está empenhado em mostrar para o mundo que seu slogan “resistente e expansível” ainda vale, apesar das perdas territoriais.
O maior campo de batalha do EI continua sendo no Iraque e na Síria, onde claramente tem seus melhores recursos.
De um total de 3.670 ataques reivindicados em todo o mundo em 2018, 1.767 foram no Iraque (48%) e 1.124, na Síria (31%).
No ano passado também houve, entretanto, aumento notável na atividade de outros afiliados do EI. Era como se o grupo quisesse compensar suas perdas no Iraque e na Síria e lembrar às pessoas que também operava fora do Oriente Médio.
Em 2018, o Estado Islâmico reivindicou 316 ataques no Afeganistão, 181 na península do Sinai, no Egito, 73 na Somália, 44 na Nigéria, 41 no Iêmen e 27 nas Filipinas.
O número relativo a ataques do EI na África Ocidental também aumentou consideravelmente nos últimos meses. O Exército tem sido o alvo principal, possivelmente porque o grupo está tentando roubar armas.
O Estado Islâmico registrou 44 ataques na Nigéria nos primeiros três meses de 2019, igualando o número total de ataques que registrou em todo o ano de 2018.
Em um vídeo de propaganda divulgado em janeiro da Província da África Ocidental, o grupo convidou os muçulmanos a migrar para a região e se juntar a ele, sinalizando que estava pronto para receber recrutas estrangeiros.
Houve também crescimento no número de ataques reivindicados nas Filipinas.
O EI opera no país por meio de afiliados locais, e a maioria deles tem lutado há décadas para estabelecer um Estado Islâmico independente no sul do arquipélago. Mas seus ataques, principalmente contra o Exército, ainda são esporádicos.
E apesar dos repetidos apelos aos seus apoiadores, o EI não reivindicou nenhum grande ataque no Ocidente em 2018, mas sete incidentes em pequena escala, que incluíram quatro ataques com faca ou arma na França e um ataque na Bélgica, um no Canadá e um na Austrália.
No ano anterior, foram quatro no Reino Unido, incluindo o atentado na Manchester Arena, os ataques em Barcelona, na Espanha, e os tiroteios em Las Vegas, nos EUA – ainda que algumas dessas alegações pareçam ter sido oportunistas, uma vez que não houve provas de envolvimento do grupo.
Jornalismo de Dados por Will Dahlgreen, Nassos Stylianou e BBC Monitoring
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Fonte: BBC