Ainda assim seguiremos gritando ‘bis’

bisQuando soube que o Balé da Cidade dançaria ao som de Caetano Veloso no Theatro Municipal de São Paulo, não cogitei a possibilidade de achar ingressos disponíveis para assistir ao espetáculo. O que pode ser mais bonito do que esse combo? Ainda mais se for à noite? Se a noite for de dezembro e o centro estiver cheio e iluminado? E se cair na sexta pré-natal, pré-férias? “Vai esgotar. Certeza.”

Acontece que soube do evento no dia da abertura da venda online e que dei sorte: no anfiteatro, penúltima fileira da sala, lá no alto, havia não só 1, mas 6 ingressos brilhando verdinhos na tela do computador e eu só precisava de 4. Disponíveis e absolutamente possíveis, custavam R$12 cada. Comprei.
Liguei para casa, e hoje percebo, que tive recepção morna. Ignorei. Nem entendi. Segui esperando o dia de encher olhos e ouvidos. E o dia chegou. Antes dele (como de costume) chegou a véspera. E na véspera Henrique, meu companheiro, declinou o convite.

Chamamos então uma amiga querida de minha filha para ir no seu lugar. Do meu lugar, fingi naturalidade, mas a vocês posso dizer que demorei para entender esse ‘não posso, não quero’. Enfim fomos. O dia correu atrapalhadíssimo – era sexta pré-natal, pré-feriado, lembram?

Chegamos, as meninas e eu, às 19h55, no toque do primeiro sinal. A cada lance de escada que subíamos, ficava mais claro para mim, a razão do preço de meus ingressos. Quando finalmente sentamos ouvi das três o que pensei entristecida: “Mas não dá pra ver nada!”. E não dava mesmo. Dali, perdíamos mais da metade do palco.

Dali vi as laterais dos balcões vazias. Dali olhei para uma das funcionárias do teatro. Dali, diante de minha provável expressão de desgosto, ela me perguntou se eu gostaria de ocupar os lugares com as crianças. É claro que não nos beneficiou em detrimento de outros pagantes. Muitos foram remanejados até o segundo sinal. Havia faltantes. Uma cota de ingressos de patrocinadores talvez, alguma autoridade que não pode estar presente. Dos mais de 1500 lugares, restaram 20 ou 30 no máximo, vazios, quando já acomodadas, esperávamos o terceiro toque.

E tocou. E os bailarinos dançaram, gritaram, correram. Que leves e ao mesmo tempo, que fortes! E foi de um preencher muito maior do que de olhos e de ouvidos. Passou rápido, embora eu saiba que não vai passar. Como é lindo observar as possibilidades de um corpo, perceber que estar presente vale a pena, comunicar seus desejos, tê-los atendidos, entender que conseguimos ocupar o lugar do outro – até mesmo o lugar físico de quem não foi. Como é lindo ver o espetáculo continuar apesar das faltas. As faltas. Podem vir! Ainda assim seguiremos gritando bis. Feliz Natal queridos.

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Fonte: Gazeta News