Como é viajar a bordo do navio Marina pelo mar Báltico

O mar parecia um espelho. A poucos metros da minha janela, em uma ilhota verde alheia aos problemas do mundo, criancinhas loiras pulavam na cama elástica. À medida que o navio avançava, mais pedacinhos de terra idílicos iam se revelando, pontilhados de casarões de madeira em tons pastéis. Em cada um deles, a bandeira da Suécia tremulando com a calma de uma manhã de verão. Toc toc toc. Batidinhas na porta da cabine me tiram da hipnose causada pela paisagem. Abro. De luvas brancas e fraque, o mordomo Dharmendra Prabhakar Devre adentra com meu café da manhã. Parece sonho, mas é “apenas” o começo de mais um dia “normal” a bordo do Oceania Marina em um cruzeiro pelo Mar Báltico, de Copenhague, na Dinamarca, até Estocolmo, na Suécia.

A escadaria do lobby diz o que está por vir: luxo à moda antiga
A escadaria do lobby diz o que está por vir: luxo à moda antiga Adriana Setti/Arquivo pessoal

Hotel de luxo flutuante

“A partir de amanhã, vocês voltarão a lavar a própria roupa, a preparar a própria comida… Portanto, aproveitem a última noite a bordo”, disse ao microfone Howard Sherman, CEO da Oceania, em um evento destinado a passageiros frequentes. Esse é o espírito da coisa. Com 240 metros, capacidade para 1.238 passageiros — atendidos por 800 tripulantes —, e varanda em 593 das 629 cabines, o Marina é um hotel de luxo flutuante.

Não há tobogãs aquáticos, simuladores 4D ou outras atrações estrambóticas que viraram regra nos cruzeiros de grande porte. “O Marina agrada a adultos maduros que apreciam qualidade e estilo, com muito espaço, além de excelente gastronomia e serviços, em um ambiente informal”, descreveu o britânico Douglas Ward, autor do Berlitz Cruising & Cruise Ships, considerado o guia Michelin dos cruzeiros.

Luxo à moda antiga

A escadaria que adorna o lobby, moldada em aço cravejado de medalhões de cristal Lalique, é uma pista do que está por vir. O que impera a bordo é o luxo à moda antiga, com direito a louças Versace, pratarias Christofle e taças Riedel. Carpetes com formas geométricas, mosaicos de mármores e lustres majestosos conferem pompa extra aos ambientes, aquecidos por cortinas frondosas e poltronas forradas em tecidos nobres.

Para onde quer que se olhe, há alguma peça da vastíssima coleção de arte do navio, que vai muito além de seu caráter decorativo. O acervo tem de estatuetas do século 13 (no spa) provenientes dos templos de Angkor, no Camboja, a uma coleção de 12 litogravuras do surrealista espanhol Joan Miró no bar do cassino, que também ostenta seis obras de seu conterrâneo Pablo Picasso.

O bar do cassino forrado de Mirós
O bar do cassino forrado de Mirós Adriana Setti/Arquivo pessoal

Vida a bordo

Apesar da profusão de estímulos visuais, as áreas comuns do Marina exalam uma tranquilidade auditiva surpreendente. A música ambiente — quando há — é sempre suave, os hóspedes se comunicam em voz baixa e nunca tem gente demais no mesmo espaço. O movimento nos seis elevadores é extremamente ágil (não me lembro de ter esperado mais de um minuto) e o desembarque/embarque em cada porto é simples e rapidíssimo, graças a um sistema de reconhecimento facial. O navio dispõe de apenas uma piscina e, ainda assim, em pleno verão, sobravam espreguiçadeiras e não havia nem sinal de confusão ao seu redor.

Longe de ser um parque temático em alto mar, o Marina não tem atrações específicas para crianças e adolescentes, ainda que eles sejam bem-vindos. Durante a minha viagem, vi apenas uma família com crianças, na faixa dos 5-8 anos de idade. A maioria dos hóspedes tem 50+ e vem de países que falam inglês (principalmente dos Estados Unidos), a língua oficial a bordo.

A piscina do Marina completamente vazia na parada em Riga, em pleno verão
A piscina do Marina completamente vazia na parada em Riga, em pleno verão Adriana Setti/Arquivo pessoal

A pompa do navio não significa que o ambiente seja formal. Muito pelo contrário. Durante o dia, o dress code é totalmente casual e, à noite, a etiqueta pede um traje country club. Traduzindo: descontraído, pero no mucho. Nada de gravatas, paletós, vestidos longos e brilhos. Mas convém evitar jeans, bermudas e afins.

Diversão e relax

O entretenimento de bordo inclui apresentações de música ao vivo comportadinhas, shows ao estilo Broadway no teatro, cassino, biblioteca com mais de 2 mil livros — e cantinhos deliciosos pra ler sossegado —, palestras sobre temas relacionados à viagem, uma bela academia, pista de corrida, quadras de esportes e spa.

Em uma das extremidades do deck 14, o Aquamar Spa é um oásis que conta com magnífico terraço ao ar livre pontilhado de day beds ao redor de duas jacuzzi que podem ser acessados pelos hóspedes das suítes.

Gastronomia

Mas o verdadeiro entretenimento no Marina, bem como nos outros navios da Oceania, é comer. Empenhada em demonstrar que comida de cruzeiro pode ter uma qualidade similar à que se encontra em terra firme, a empresa tem como chef executivo o francês Jacques Pépin. Célebre por seus programas de TV nos EUA, ele abriu sua primeira casa em alto mar no Marina, o Jacques, um dos quatro restaurantes de especialidades a bordo. Ao contrário do que acontece em boa parte dos cruzeiros, as refeições nesses lugares estão incluídas no preço da viagem. Basta reservar. Já no Grand Dining Room e no bufê do Terrace Café, o hóspede pode chegar sem aviso prévio e não há lugar fixo.

A coleção de restaurantes de especialidades ainda conta com o Red Ginger, de comida asiática refinada em um ambiente decorado com detalhes em madeira escura e poltronas vermelhas; o Toscana, um italiano respeitável onde tudo começa com uma degustação de azeites de oliva; e o Polo Grill, especializado em cortes de carne premium. Em todos eles, o serviço é impecável e os pratos vêm em porções generosas, com apresentações bem cuidadas. Lagosta, camarão e cortes de carne premium abundam no menu. Quem quiser aprender algumas receitas servidas pode se divertir nos cursos do Culinary Center.

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Trilogia de vieiras no red Ginger: ingredientes nobres em abundância
Trilogia de vieiras no red Ginger: ingredientes nobres em abundância Divulgação/Reprodução
A pompa do Grand Dining Room
A pompa do Grand Dining Room Divulgação/Reprodução

A experiência gastronômica mais elaborada a bordo rola no La Réserve, que oferece um menu degustação com maridagem de vinhos em parceria com a revista Wine Spectator para apenas 24 comensais — pago à parte. Outra noite especial pode acontecer no Privée, um espaço que pode ser alugado por grupos de até 10 comensais, com uma mesa glamourosa sob um grande candelabro, com vista para o mar. Nesse caso, os hóspedes podem escolher pratos do Toscana ou do Polo Grill.

Entre os bares e cafés, o mais simpático é o Baristas, com vista panorâmica para o mar e a piscina, que serve aperitivo à moda italiana no fim da tarde, com espaço, computadores (e café bom!) para quem precisa fazer home office. Mas, a partir do cair da noite, todos os caminhos levam ao Horizons, onde rola música ao vivo e sessões animadíssimas de karaokê.

A minha Penthouse Suite por dentro
A minha Penthouse Suite por dentro Justin Kriel/Divulgação

A cabine

Ainda que o ponto dos eggs benedict do café da manhã a la carte do Grand Dining Room seja tão irretocável quanto o serviço, pedir café da manhã na cabine é um luxo incluído na tarifa que não deve ser desperdiçado. Sustentar a xícara quentinha — ou uma taça do champanhe de boas-vindas — entre as mãos observando a paisagem foi um dos melhores momentos da viagem.

Com 40m2, minha suíte Penthouse tinha um pequeno longe, além do dormitório com cama perfeita, banheiro enorme com banheira separada da ducha, varanda espaçosa, amenidades Bulgari e serviço de mordomo 24 horas.

XXXXX, meu sorridente mordomo (que tirou a máscara só para a foto), após trazer o café da manhã
Dharmendra, meu sorridente mordomo (que tirou a máscara só para a foto), após trazer o café da manhã Adriana Setti/Arquivo pessoal
O Marina atracado em Tallin, na Estônia
O Marina atracado em Tallin, na Estônia Adriana Setti/Arquivo pessoal

Excursões

Ao contrário do que acontece nos transatlânticos que são resorts flutuantes, onde falta tempo para aproveitar tantas atrações, nos cruzeiros da Oceania os destinos têm muito protagonismo. A prova disso é que o navio fica praticamente inabitado durante as paradas, recobrando vida no fim da tarde, especialmente quando os bares oferecem promoções na happy hour.

A adesão dos passageiros às excursões em terra é enorme. E a companhia se esforça em sair do lugar comum nesse quesito. Para além dos clássicos city tours, há passeios que proporcionam experiências mais alternativas. Em Tallin, na Estônia, por exemplo, participei de um tour a pé pelo hub criativo da cidade, que passava por iniciativas vinculadas ao consumo sustentável e terminava com visita e almoço no Fotografiska, um hypadíssimo museu de fotografia, onde estava rolando uma exposição do badalado fotógrafo de celebridades Frank Ockenfels. Já em Kotka, na Finlândia, fiz um rafting por um rio em meio aos bosques do sul do país.

Passeio sobre consumo sustentável em um mercadinho de segunda mão de Tallin, na Estônia
Passeio sobre consumo sustentável em um mercadinho de segunda mão de Tallin, na Estônia Adriana Setti/Arquivo pessoal

Roteiros

A viagem da qual participei partia de Copenhague, na Dinamarca, e passava por Kiel, na Alemanha, Visby, na Suécia, e Klaipeda, na Lituânia, antes de chegar a Riga, na Letônia, onde embarquei. De lá, partimos rumo a Tallin, na Estônia, paramos Helsinque e Kotka, na Finlândia, e ancoramos em Estocolmo, onde passamos uma noite a bordo antes do desembarque.

Até dezembro, o Marina fará roteiros pelo Mediterrâneo, antes de zarpar rumo a Miami, de onde parte no dia 18 de dezembro em direção ao Brasil, onde navegará pela Amazônia. Em janeiro, ele passará pelo Rio de Janeiro e fará rotas pela América do Sul. Já no ano que vem, o Marina passará por uma reforma geral em todas as suas cabines, enquanto os espaços públicos vão ganhar uma paleta de cores com a renovação de tecidos, móveis e luminárias. Em novembro de 2023, estará novinho em folha para novas aventuras no mar.

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Fonte: Viagem e Turismo