Bolsominions transformaram churrasco em circo da macheza frágil

Eu não convidaria Jair Bolsonaro nem para uma assembleia de condomínio, mas não é assim que funcionam as relações internacionais.

Aposto que as Nações Unidas tampouco queriam a visita do nosso tóxico presidente. Sucede que diplomacia é feita de protocolo, segundo o qual a Assembleia-Geral da ONU é sempre aberta com um discurso do presidente do Brasil.

No púlpito, Jair zurrou as mentiras de sempre e picou a mula rapidinho. Foi relinchar para a claque numa churrascaria brasileira em Nova York. Subiu na mesa e repetiu as grosserias de campanha para o gado que se acomodava nas cadeiras, nos espetos e nos pratos.

Jair nutre um gosto especial por churrasco e churrascarias. No primeiro debate desta corrida presidencial, ele almoçou com o Veio da Havan e outros asseclas no tradicional Laço de Ouro, em São Paulo. Saiu sob vaias e aplausos dos clientes pagantes.

No Dia das Mães de 2021, empunhou e ostentou uma picanha de gado wagyu vendida a R$ 1.799 o quilo por um frigorífico de Goiânia. Em janeiro do mesmo ano, a elite da música sertaneja o saudou aos gritos de “mito” num rodízio de Brasília.

Jair se apossou do churrasco como uma trincheira do macho branco. Lá ele combate as pautas que ameaçam o status quo.

Entupir-se de carne é uma óbvia afronta aos vegetarianos e veganos. Colide com o ativismo ambiental, já que mais pasto significa menos árvores.

Churrasco, o acontecimento social, é um espaço protegido dos freios politicamente corretos. Rebanhos de homens podem falar mal de mulher gorda, fazer piada racista, arrotar, peidar e se emporcalhar de farofa –como o próprio Jair faz e posta com orgulho nas redes sociais.

Rato político, ele apenas se apropriou de uma tendência. Churrasco –assim como o gosto por motocicletas, cerveja artesanal e rock clássico– virou bandeira de homens em desespero pela afirmação da própria virilidade.

Dá-lhe bois e porcos inteiros no espeto, expostos como troféus de caça. Dá-lhe avental de couro, faca de meio metro e boné com caveira bordada para cobrir a calva. Dá-lhe barba. Dá-lhe pança. Bacon!!! Selva!!!

E aí surge o drama de quem gosta de churrasco e odeia a corja reacionária. Churrascos trazem sentimentos conflituosos: estranheza, desconforto e algo de culpa.

É preciso resgatar o churrasco daquilo que se convencionou chamar de masculinidade frágil. Desse espetáculo patético de macheza flácida, cheio de elementos fálicos e mentiras sobre o desempenho sexual.

Vou falar em defesa da família –a que ponto chegamos, ai, ai!– para que o churrasco volte a ser um encontro sossegado e acolhedor, com crianças e mulheres, com conversas que não rendam processo penal em outros ambientes.

Cervejinha e água mineral. Picanha para quem é de carne, abobrinha para quem é de legumes. Abraços, beijos e companheirismo. E que todos tenhamos dinheiro para um churrasco de vez em quando.

Para tirar a primazia do churrasco desse bando de machinhos molengas, já sabemos o que é necessário fazer no próximo dia 2.

(Siga e curta a Cozinha Bruta nas redes sociais. Acompanhe os posts do Instagram e do Twitter.)

Fonte: Folha de S.Paulo