Recém-inaugurado, o Parque Campana, em Brotas, uma cidadezinha do interior de São Paulo com menos de 25 mil habitantes que, nas últimas décadas, se transformou em um lugar de turismo ligado a esportes ao ar livre, com rafting, trilhas, tirolesas e outras aventuras em que a adrenalina é a grande recompensa, oferece o contrário dessas experiências. É um lugar de calma, silêncio e contemplação.
O visitante precisa agendar sua visita pelo site ou pelo email do parque, e será guiado por uma caminhada de uma hora, em ritmo lento, para que tenha tempo de observar por todos os ângulos que quiser os pavilhões feitos com materiais como galhos de árvore, pedras da região, bambus, tijolos e plantas mesmo, que irão crescer e mudar seu aspecto com o passar do tempo.
O silêncio, entrecortado apenas pelo som dos pássaros, da água e do movimento das plantas e das folhas, provocado pelo vento, somado à visão das obras criadas especificamente para cada parte do parque, faz com que a estranheza inicial de dar de cara com estruturas retangulares, como vasos altos, colocadas em ângulos diversos, que parecem estar pendendo para os lados, com uma planta no topo de cada uma, vá, pouco a pouco, dando lugar a um sossego inexplicável.
Humberto explica que passou horas e horas pesquisando a luz natural, o relevo do chão, a vista existente, para só então criar os pavilhões. Talvez, por isso, no meio da visita, quando os olhos, os ouvidos e a mente finalmente se adaptam àquela estranha paisagem, o visitante é inundado pela sensação de que é perfeitamente natural encontrar imensas obras de arte naquele pedaço de terra.
Esse refúgio é obra da criatividade de dois artistas reconhecidos internacionalmente, muito mais no resto do mundo que no Brasil: os irmãos Campana, a dupla de designers formada por Humberto e Fernando (1961-2022), que saíram de Brotas e chegaram às grande galerias e museus de arte com uma combinação radical e inovadora de criatividade, senso de humor e crítica social.
Em termos práticos, o que Humberto e Fernando fizeram foi juntar, de maneira inédita, materiais muito rústicos, quase sem valor nenhum, como restos de madeira, plástico-bolha, papelão, coisas que você encontra muito mais frequentemente no lixo reciclado que em lojas de móveis caros, a um design irresistível, moderno e charmoso, sem abrir mão de conforto nem funcionalidade.
O Parque Campana é um desdobramento da sensibilidade destes dois artistas brasileiros, que acabou sendo produzido apenas por Humberto, depois da morte precoce e chocante de seu irmão mais novo, aos 61 anos, em 2022. “Durante a pandemia, quando a gente foi obrigado a ficar trancado em casa, começamos a passar mais tempo nessa terra, em Brotas, que ganhamos de herança”, conta Humberto, em uma visita guiada no dia da inauguração do parque.
Desde o ano 2000, os dois irmãos começaram a se envolver com a terra, e que sempre tinha sido usada por seus antepassados como uma fazenda tradicional, com plantações, pasto etc. “Meu pai era agricultor, mas nós nunca tivemos interesse em tocar uma fazenda, então a primeira coisa que fizemos foi plantar 16 mil mudas de plantas nativas, locais, para reflorestar o que as plantações e a pecuária tinham desmatado por tanto tempo“, diz o designer.
Durante a pandemia, o sonho cresceu para todos os lados. Em vez de apenas reflorestar a terra, Humberto e Fernando decidiram fazer deste lugar, tão pertinho do centro da cidade, um imenso espaço dedicado às maiores paixões da dupla: arte, educação e natureza.
“Muita gente acha que o Parque Campana é uma espécie de Inhotim, mas não tem muito a ver. Inhotim é um lugar lindo, mas cheio de estímulos, barulhento. Aqui é um lugar de silêncio, de contemplação, de cura”, afirma o seu criador.
“Meu interesse maior é compartilhar essa experiência com as pessoas. Já dei aula em vários lugares do mundo, agora quero fazer isso no nosso quintal, e deixar para essa comunidade, e para quem tiver interesse, um convite para se aproximar do nosso trabalho, ver a natureza com amor e respeito. Celebrar a vida mesmo, sabe?”.
A experiência de caminhar pelos oito pavilhões que já estão prontos nessa fase inaugural do Parque, pelas alamedas de chão de terra cobertas por pedriscos encontrados na região, deixa clara a sensação de que fala Humberto. As obras, todas construídas com objetos rústicos, sem cores artificiais, dão às vezes a impressão de que aquele é o resquício de uma civilização de outro tempo, ou de outra dimensão.
Os pavilhões, todos batizados com nomes de pessoas, são de tirar o fôlego pela engenhosidade e escala gigantes, ao mesmo tempo que provocam uma sensação de que, ali, nada é urgente. É como se, ao entrar naquele santuário natural transformado em exposição permanente, o relógio passasse a andar mais devagar, como se a vida, por uma ou duas horas, tivesse apertado o botão de “pause” no controle remoto.
PROGRAME-SE PARA IR
Visitas
Os dias de visitação são a última sexta-feira e sábado de cada mês, exceto feriados. Durante o período de férias escolares, serão dois finais de semana por mês. Os ingressos são limitados a 30 pessoas por período (manhã e tarde) e devem ser adquiridos no site.
Valores
R$ 50 por adulto, R$ 25 meia-entrada. Crianças de até cinco anos, idosos com mais de 65 e grupos de escolas públicas não pagam.
Próximas datas
Dias 29 e 30/11, 13,14, 27 e 28/12. Em 2025: 10 e 11/0, 24 e 25/1; 7, 8, 21 e 22/2.
Localização
Brotas fica a aproximadamente 3h de São Paulo, e o parque fica a oito minutos do centro da cidade.
Fonte: Folha de S.Paulo