O arroz com feijão de R$ 89 do Paris 6: brasileiros amam restaurantes ruins

Quase R$ 90 por um prato-feito de arroz, feijão, picadinho, farofa, banana à milanesa e dois ovos. Essa é a descrição do novo item do cardápio da rede de restaurantes Paris 6 –batizado Luva de Pedreiro em alusão ao influenciador e vendido a R$ 89 mais taxa de serviço.

O Paris 6 não se notabiliza pela qualidade da comida. Ganhou fama por oferecer jantares grátis a atores, músicos e outras celebridades que batizam seus pratos. O público geral é atraído por esse minizoo de gente famosa.

E quanto ao prato do Luva de Pedreiro? Não comi, não pretendo comer e ainda assim acho impossível que seja melhor do que um PF de R$ 35 num boteco –valor plausível para os Jardins, região rica de São Paulo em que o primeiro Paris 6 se instalou.

Eu já comi, tempos atrás, um prato semelhante que o D.O.M., de Alex Atala, servia no almoço, também com preço amalucado para arroz e feijão. Era constrangedor constatar o desempenho pífio do restaurante ao ousar competir em outra liga. Como se um peso-pesado fosse boxear um peso-pena e desmaiasse de cansaço de tanto correr para tentar alcançar o magricela.

E olha que estamos falando do Atala, que na época estava entre os dez chefs mais bem-avaliados do mundo. Já o Paris 6 não tem esse capital gastronômico para colocar em risco. Seu maior sucesso é um picolé Magnum atolado no petit gâteau.

A comida do Paris 6 é fraca, os frequentadores sabem disso e não dão a menor pelota. Brasileiro adora um restaurante ruim e caro. Adora um bar que cobra o preço de um almoço por um coquetel intragável. A bem da verdade, esse é um fenômeno mundial. A popularidade de uma casa nada tem a ver com a qualidade da comida, da bebida ou do serviço.

Tome os rankings colaborativos como o do site de viagens Tripadvisor. Neste, o melhor restaurante de São Paulo é uma parrilla de estilo uruguaio chamada Fuego Celeste, avaliada com duas estrelas no Guia Folha (a nota máxima é cinco). A Casa do Porco, que ocupa o sétimo lugar na lista 50 Best, amarga a posição 67 no Tripadvisor. Dentre os restaurantes da cidade de São Paulo, apenas.

Assim como há multidões de fãs do Romero Britto e de Jair Bolsonaro, restaurantes e bares ruins arregimentam admiradores dispostos a defendê-los com paixão.

Recentemente, publiquei no Guia uma resenha sobre o bar C… do Padre, em Pinheiros. No texto, eu citava como ponto negativo a localização próxima demais da rua Guaicuí, que se tornou um corredor de bares horrendos.

No post do Guia no Instagram, ebuliu a ira do fã-clube da Guaicuí. Disseram que eu não entendia nada de bares e que deveria procurar um rooftop na Faria Lima. Então tá.

O problema da Guaicuí é juntar bares demais, com música alta demais e gente demais num espaço exíguo demais. Até um bar bom vira programa furado nessas condições –há um par deles na Guaicuí, mas a geolocalização infelizmente os torna ruins.

Os botecos restantes fazem zero esforço para oferecer algo minimamente passável. Os clientes estão saindo pelo ladrão de qualquer maneira. É como pescar no pesqueiro, para que fazer melhor?

Se os bares ruins e o Paris 6 vivem lotados, é porque muita gente gosta deles. Isso é algo com que nós –os ditos especialistas, que esses fãs repudiam– temos de conviver. É inútil se estressar ou tentar mudar algo. A solução é ignorar os comentaristas da internet.

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Fonte: Folha de S.Paulo