Postais da humilhação

“Saudações da Costa Rica! Desesperado por viajar, peguei uma lista recente de países que aceitam brasileiros como turistas e a usei como um roteiro. Pode chamar de Volta ao Mundo da Humilhação! O importante é que estou aqui, esquecendo que temos o estigma de vivermos em um celeiro de cepas de Covid-19, fruto de um plano irresponsável de contenção de uma doença que nos fecha fronteiras. Ou da ausência dele. Mas o importante é que estou viajando, não quero parecer ingrato a este país que agora me acolhe. Especialmente com essas praias tão estupendas. E olha que estou só na Costa Oeste. Meu hotel está meio vazio. Aliás, bem vazio. Beijos e… Pura Vida!”

“Bratislava, enfim! Quando visitei a Tchecoslováquia, nos anos 1980, ela não estava nos planos. Fui a Praga, claro, me apaixonei pelo centro histórico mais charmoso de toda a Europa e declarei o país como visitado. Aí veio a tal Revolução de Veludo em 1993 e a República Tcheca e a Eslováquia se tornaram dois países separados… Mais um para a minha lista de desejos, agora já realizado. Sabe que a cidade tem seu charme?”

“Adorável Skopje! Será que tenho que agradecer pelo fato de os brasileiros serem aceitos por tão poucos países hoje e, assim, ter conhecido esta pequena joia? Já andei bem aqui pelos Bálcãs, mas a Macedônia do Norte é um país novo, eu sei. Confesso que não estaria no meu radar não fosse a reduzida lista de lugares que nos recebem nestes tempos. Já ansioso pra ir ao interior do país, pois as paisagens parecem belíssimas. Lago Ohrid, me aguarde!!”

“Tirana, enfim! Quando fazia reportagens para o ‘Fantástico’, tentei por mais de uma vez vir para cá. Não tive sorte. Mas se diz que tudo acontece na hora certa, né? A Albânia não goza de uma reputação excelente com os turistas, apesar de ter uma natureza privilegiada (lago Koman!) e um conjunto fantástico de antiguidades, da Roma antiga à herança otomana. É exatamente o tipo de lugar que eu gosto de visitar. E é barato! Eu só queria não ficar preocupado com minha carteira o tempo todo…”

“Cheguei em Bangui há dois dias e só hoje estou me acostumando à ideia de sair do hotel. Já viajei por dezenas de países no continente, mas a República Centro-Africana provou ser um desafio a mais. Não, não estou reclamando. É para países assim que estamos podendo viajar… Insisto! Amo explorar a África, mesmo com todos os perrengues que a gente sabe que vai passar. Mas as coisas estão um pouco lentas. A Notre Dame daqui é linda, vi no trajeto do aeroporto. E vou tentar um safári. As expectativas não são altas, mas, por outro lado, já tive boas surpresas no continente. Bora ver!”

“Cabul é fascinante. Mesmo. Sei que, dos postais que estou mandando, o mais estranho talvez seja este. O Afeganistão é um país que eu sempre achei que iria visitar para fazer uma reportagem. Porém, aqui estou eu, como turista, aproveitando as poucas opções de destino que restam hoje aos brasileiros. E estou realmente surpreso. Já fui a Herat (fascinante) e Mazar-e-Sharif (deslumbrante). E agora estou me apaixonando por Cabul. Tá tenso? Tá. Mas tá bom? Tá ótimo!

“Estou em algum canto de Nauru, mas não tenho bem certeza de onde. Num país com território de 21 km², tanto faz, né? Eu já tinha ido a um país pequeno: Tuvalu, também na Oceania. Mas Nauru é ainda menor. Andei toda Yaren, a capital, em minutos. Não é exagero. E resolvi passear por toda sua extensão nacional. Fico imaginando se eu tivesse nascido aqui. Qual seria meu horizonte?”

“Que saudades de Nuku’alofa! Pouca coisa mudou desde que estive aqui, em 1999, fazendo uma reportagem sobre o primeiro país na Terra a dar boas-vindas ao ano 2000: Tonga! Aquela vida tranquila. Aquele marzão! Aquela obesidade abundante, um problema crônico no país. Tudo na mesma. Bem diferente do meu Brasil, para onde volto agora. Por ali, mesmo acompanhando apenas de longe, as coisas só estão mudando para pior.”

Fonte: Folha de S.Paulo