Sem navios de cruzeiro, caribenha Anguilla aposta em luxo descomplicado

Um paraíso de areias brancas e mar verde-água com um certo ar de décadas passadas —quando as lojas de grife ainda não tinham tomado o Caribe, disputando com cassinos a atenção de turistas de cruzeiros e de hóspedes adeptos do serviço all inclusive.

A cerca de 18 quilômetros da ilha de São Martinho, a também pequena Anguilla (que os locais pronunciam como se houvesse um trema, “Angüilla”) aposta em outro roteiro: resorts de luxo e hotéis boutique com o tipo de despretensão pé na areia que atrai casais, famílias endinheiradas e celebridades em busca de descanso dos holofotes.

A expansão do turismo se deu principalmente nas últimas três décadas, e colocou o setor como o mais importante para a economia local, que também lucra com a pesca da lagosta e os bancos “offshore”.

Considerado o primeiro resort de luxo no território, o Malliouhana, construído nos anos 1980, representou o começo da virada onde, 20 anos antes, faltavam energia elétrica e rede de telefonia.

O hotel, aliás, recupera o nome que a ilha tinha originalmente, batizada pelos indígenas que chegaram por lá cerca de 4.000 anos atrás —o termo significa “serpente marinha em forma de flecha”.

Consta que Cristóvão Colombo navegou pela região em 1493, mas não desembarcou no território, que foi rebatizado pelos europeus com o nome atual —”enguia” em espanhol.

A ilha foi então colonizada por ingleses em 1650 e chegou a integrar a Federação das Índias Ocidentais, como São Cristóvão-Névis-Anguilla. Com a separação formalmente reconhecida em dezembro de 1980, Anguilla se tornou um território ultramarino britânico, status que mantém ainda hoje.

Se o premiê Ellis Webster propusesse uma distribuição do litoral pela população do país, seriam apenas 545 pessoas em cada uma das 33 praias. Mas os 18 mil moradores aparecem bem pouco, e muitos turistas passam parte do tempo nas piscinas dos resorts, o que deixa bastante tranquilas as faixas de areia.

Ali, todas as praias são públicas, e o acesso é garantido mesmo nas áreas em que os hotéis e resorts colocam seus serviços na areia, com cadeiras, guarda-sóis e drinques gelados.

Uma das mais famosas é Shoal Bay East, com águas calmas e areia bem branca, alguns restaurantes, e um dos hotéis de luxo da ilha, o Zemi Beach House —os funcionários gostam de dizer que ali os turistas encontram “sua casa longe de casa”.

Num canto silencioso do hotel, o Thai House Spa chama a atenção pela construção de madeira de teca escura, integrada com as árvores. A casa foi erguida 300 anos atrás na Tailândia, usando uma técnica tradicional que dispensa os pregos.

No início dos anos 1970, ela foi completamente desmontada, e as peças foram transportadas para Anguilla, para serem remontadas no terreno que anos mais tarde seria transformado em hotel.

Apesar do conforto das suítes e das “penthouses” com piscinas privativas, o clima é descomplicado: os hóspedes circulam de chinelo e camiseta e podem tomar café da manhã nas mesinhas com os pés na areia.

Alguns aproveitam para explorar a água logo à frente em caiaques, pranchas de stand-up ou com equipamento para mergulho com snorkel.

Para ver mais peixes e corais, a escolha pode ser a ainda mais vazia e tranquila Barnes Bay, quase no extremo oeste da ilha. É onde fica outro gigante do luxo instalado em Anguilla, o Four Seasons, com quase todas as acomodações tendo vista para o mar.

Do outro lado do Four Seasons está Meads Bay, com o mesmo cenário de água muito transparente, areia clara e horizonte de céu azul.

Para mudar um pouco a perspectiva e alcançar dois dos pontos mais bonitos do lugar, é preciso pegar um barco, saindo de Sandy Ground.

O primeiro é Sandy Island, um pedacinho de areia com um restaurante e cadeiras de praia no meio do oceano. Apesar de muito procurada, não chega a ficar lotada, e dá para aproveitar tanto a água quanto a área seca.

O segundo é Scilly Cay, que abriga um restaurante tocado pela mesma família desde 1985, servindo lagostas, lagostins e pargos preparados na churrasqueira, para acompanhar o ponche de rum —a bebida é tão caribenha e onipresente quanto os johnny cakes (bolinhos de farinha, sal, açúcar e manteiga, que podem ser fritos ou assados, e têm algum parentesco com os bolinhos de chuva brasileiros).

Aviso importante: nem pense em procurar uma tomada para recarregar o celular enquanto espera o almoço chegar, porque não há energia elétrica por ali.

Como as distâncias são pequenas, dá para conhecer as duas ilhotas no mesmo dia e ainda parar em pontos de mergulho, incluindo a prainha de Little Bay, espremida entre penhascos (os mais corajosos pulam de lá).

Do barco também se vê de outro ângulo o Arco, esculpido nas falésias calcárias na costa oeste da ilha e acessado por terra para fotos bastante instagramáveis.

Dizem os marinheiros que há golfinhos na região, mas nenhum deles deu as caras durante a visita da reportagem, no começo de novembro passado.

Com uma área de 91 quilômetros quadrados, Anguilla pode ser facilmente percorrida também por terra. O caminho para cruzar a ilha —na maior parte, uma única pista que vai e outra que vem— passa pela capital, The Valley (que concentra os prédios do governo, o comércio e o aeroporto), e por muitos terrenos vazios, casas com quintal e uma coleção de prédios abandonados.

Algumas dessas construções são tema de disputas judiciais por espólio, outras foram interrompidas no meio do processo por falta de dinheiro dos investidores, e outras ainda sofreram danos importantes durante a passagem do furacão Irma.

O ciclone tropical, que devastou a ilha em 2017, destruiu a infraestrutura de energia elétrica, derrubou prédios do governo e danificou hotéis e resorts.

Muita coisa foi rapidamente recuperada, mas parte ficou sem manutenção. Ao longo dos anos, fios, portas, janelas e outros itens têm sido levados, deixando para trás enormes esqueletos congelados no tempo e maltratados pela maresia.

Não há transporte público no território. Para circular, é possível alugar um carro (e necessário não se esquecer jamais de dirigir na mão inglesa), ou acertar os destinos com um motorista de táxi.

Para uma dose extra de charme, vale optar por um Moke. Os jipinhos retrô de fabricação britânica estão disponíveis em várias cores, com capota reversível e opções de transmissão automática ou manual.

Um luxo moderno, com ar de antigo, para combinar com o espírito da ilha.


SERVIÇO

COMO CHEGAR
A American Airlines tem voo direto de Miami. Outras companhias fazem conexão em Porto Rico ou em São Martinho. Também é possível atravessar pelo mar, vindo de São Martinho. As balsas operam várias vezes ao dia.

ONDE FICAR
Aurora Anguilla
https://www.auroraanguilla.com/
Diárias a partir de US$ 949*.

Belmond Cap Juluca
https://www.belmond.com/hotels/north-america/caribbean/anguilla/belmond-cap-juluca/
Diárias a partir de US$ 1.962.

Four Seasons
www.fourseasons.com/anguilla
Diárias a partir de US$ 1.280.

Malliouhana
https://aubergeresorts.com/malliouhana/
Diárias a partir de US$ 728.

Zemi Beach House
www.zemibeach.com/
Diárias a partir de US$ 928.

* Preços checados em 24.nov.2022.

A jornalista viajou a Anguilla a convite do Conselho de Turismo de Anguilla

Fonte: Folha de S.Paulo