Trancoso é reduto hippie chique do Réveillon, com praias para todos os perfis

É fim de tarde quando dois times formados por garotos de corpos sarados disputam uma pelada no campinho do Quadrado. Diante de casas laterais de cores vivas, janelas e portas abertas, uma procissão segue rumo ao mirante que fica detrás da igreja São João Batista. Aquele é um ponto estratégico para avistar o mar e se despedir de mais um dia de verão.

Avistamos o rio Trancoso, que dá nome ao famoso vilarejo baiano. Suas águas, ao se encontrarem com o mar, separam a praia do Nativo da dos Coqueiros. Em período de maré baixa, é possível cruzar a foz do rio caminhando.

A Bahia é terra apinhada de praias incríveis, capazes de seduzir os mais variados perfis de apaixonados pelo mar. Há, todavia, um lugar de areia macia, falésias coloridas, piscinas naturais e uma oferta generosa, tanto gastronômica quanto hoteleira, que faz de Trancoso um dos principais destinos turísticos do país.
Nesta temporada de verão, são esperadas 80 mil pessoas em Trancoso, segundo cálculo da Secretaria de Turismo de Porto Seguro, município do qual o vilarejo é distrito.

Concorrida quase o ano inteiro, Trancoso é um dos points mais disputados no Réveillon. Neste ano, estima-se, ainda de acordo com a secretaria, uma maior demanda tanto nas festas fechadas como nas abertas ao público.

Hospedagem não é problema por lá, e as opções vêm se diversificando. Trancoso também vive um momento de expansão imobiliária, com a construção de condomínios e casas de alto padrão.

São, basicamente, três as regiões que concentram hotéis e pousadas. No Quadrado, ficam as pousadas mais charmosas, como a Uxua, pertinho de lojas, restaurantes e bares, que abrigam o fervo nas noites quentes de lua cheia. A faixa de areia mais próxima do Quadrado é a da praia dos Coqueiros. Ela oferece boa infra, inclusive para as crianças. E dá para ir até lá caminhando.

Quando o assunto é pé na areia, a charmosa Estrela d’Água, na praia dos Nativos, a 700 metros do Quadrado, é excelente opção. Encravada num ponto ainda cercado pela exuberância da mata atlântica, a casa pertenceu à cantora Gal Gosta (1945-2022) antes de virar pousada.

De frente para o mar, à esquerda, uma pernada leve, de 20 minutos, leva o banhista até a praia do Rio da Barra. Dizem que foram as suas falésias brancas e vermelhas que chamaram a atenção de Pero Vaz de Caminha, que chegou a descrevê-las ao rei de Portugal durante o descobrimento do Brasil, naqueles tempos em que o país ainda era chamado de Terra de Santa Cruz.

Opção resort, voltada sobretudo para a família, o Club Med Trancoso não é pé na areia. Para chegar à praia, é necessário descer de “elevador” ou por uma escadaria de madeira. O complexo está instalado no alto de uma falésia, que atinge 40 metros de altura, tendo aos seus pés uma praia praticamente deserta e encantadora, a de Taípe.

De cara para uma das faixas litorâneas mais belas do sul da Bahia, que formam a praia de Itapororoca, a rede Fasano vem coroar essa lista de luxo e conforto, ao mesclar o rústico com o sofisticado em meio à beleza natural.

Assinado pelo arquiteto Isay Weinfeld, o Fasano Trancoso abriga 40 bangalôs (que medem de 60 m² a 206 m²), em meio a um cenário de mata atlântica bem de frente às piscinas naturais de águas mornas que se formam na maré baixa. O deque se estende por cerca de 500 metros em meio à mata e à restinga. Além de servir de travessia, oferece bela vista para a praia e abriga as duas piscinas (uma adulta e uma infantil) do hotel.

No cardápio, há frutos do mar e o melhor da tradição da gastronomia italiana, marca registrada da rede. O restaurante principal serve o café da manhã e o jantar. Há ainda uma área montada sob a sombra de amendoeiras de cara para o mar, espaço certeiro para curtir os fins de tarde, acompanhado de boa música.

Acostumada a tocar em lugares paradisíacos mundo afora, a DJ Monica Soldan, brasileira que vive em Londres, passou o Réveillon e o verão passado no Fasano de Trancoso.

“Foi incrível tocar tendo aquele visual paradisíaco, com o clima gostoso do verão baiano, embaixo de uma amendoeira, bem de cara para o azul do mar”, recorda-se. “Desta vez, tocarei na noite de Réveillon do Mandarin Oriental Hyde Park, no inverno londrino. Imagina como está o meu nível de saudade da Bahia.”

É nesta época do ano que a badalação toma conta do pacato vilarejo na chamada Costa do Descobrimento, embora ainda seja possível assistir a uma missa na igrejinha. Corre na boca do povo, e na do padre também, que a igreja dedicada a São João Batista, o primo de Jesus, tem origem entre os séculos 17 e 18.

Seu formato remonta ao trabalho de evangelização dos padres jesuítas na região desde os primórdios do descobrimento.

Trancoso sempre foi um ponto de fuga. A começar pelos jesuítas, que, no começo no século 16, fundaram a localidade para proteger os índios dos magnatas coloniais.

Nos anos 1970, chegaram os hippies e outros grupos que se sentiam um tanto à margem da sociedade, com o propósito de ali encontrar um mundo, desenhado entre o mar e a mata atlântica, distante da agitação e dos infortúnios da vida urbana. À procura de inspiração na luz e no clima revigorante da costa baiana, chegaram, então, os artistas.

Com quilômetros a perder de vista, a praia era (e ainda é) perfeita: recorta livremente o mar, que avança em variada paleta de tons azuis e verdes, oscilantes a depender da incidência solar, conduzindo os sonhos dos visitantes.

A título de curiosidade, o Quadrado, na verdade, tem a forma de um retângulo.

Reparo feito, vamos ao que, de fato, interessa: banho de mar, pular ou não as sete ondinhas, brindando cerveja como se fosse champanhe. Pouco importa. Não há estresse que resista ao efeito Trancoso.

Fonte: Folha de S.Paulo

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