Viajando nos edifícios de arquitetura pelo mundo

Uma tristeza a morte, no último dia 4, do cartunista Paulo Caruso. Eu o conheci quando, aos 17 anos, ingressei na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP. Logo notei (e como não notar??) os gêmeos veteranos, bem mais velhos mas cheios de jovialidade, perambulando juntos pelo generoso espaço da escola: Chico e Paulo Caruso. Magrelos, altos, cabelos compridos escorridos como os do Peninha da Disney.

Idênticos, era-lhes fácil enganar incautos. Certa vez Paulo (ou Chico) ficou de emprestar-me um livro; no dia seguinte, cruzando com Chico (ou Paulo) sem perceber que era o outro, cobrei dele. Percebendo o engano, ele me passou uma descompostura (“Achou mesmo que eu traria? Que eu confiaria em você?” etc.) –e foram bons segundos de bate-boca até eu perceber o engodo.

Depois da faculdade foram vários encontros pela noite, como no bar Riviera, à época uma decente pocilga (que Paulo retrataria em gibis).

Tendo Chico mudado para o Rio, ficou mais fácil identificá-los: quando visitei a redação do jornal O Globo, sabia que o desenhista que estava lá era o Chico; já nas várias vezes no Roda Viva, da TV Cultura, era o Paulo (mesmo porque assim assinava as caricaturas que fazia de mim).

As lembranças da FAU me remetem àquele espaço onde conheci Paulo e tanta gente –e como aquele edifício magnífico estimulava nossas relações e criatividade. Quem não estudou arquitetura pode achar um exagero. Mas (remetendo à minha coluna anterior, sobre a logomarca do turismo brasileiro) se meros centímetros de forma e cor podem dizer tanto até mesmo sobre um projeto de país, o que dizer do espaço edificado em abrigo onde se vive, trabalha, sonha, ama. Ou, numa escola, se estuda e projeta o futuro.

Terminado em 1969, o edifício da FAU, projeto dos arquitetos Vilanova Artigas e Carlos Cascaldi, me impressionava tanto que sempre o imaginei como um objeto de peregrinação, que visitantes de toda parte deveriam ir conhecer.

Eu mesmo, graças a ele, virei um turista de escolas de arquitetura. Se um edifício pode ser um marco, imagine um edifício onde pessoas aprendem a fazer outros edifícios.

Lembro a curiosidade de ver a escola de arquitetura de Cambridge, na Inglaterra. Mas ali a centenária faculdade aninhara-se nos majestosos prédios preexistentes (a universidade tem oito séculos!).

Muitas faculdades europeias estão em edifícios antigos. Mas eu farejava aqueles desenhados com a específica função de ensinar arquitetura. Artigas foi um dos pioneiros, com seu caixote brutalista de concreto apoiado graciosamente em pilares de trapézio delimitando uma grande praça que unifica toda a escola com seu entorno –e seus ocupantes.

Mas vieram outras. Por exemplo, a Escola de Arquitetura do Royal Institute of Technology (do escritório Tham & Videgård) em Estocolmo (Suécia), nave pousada entre antigos edifícios de tijolos, dos quais rouba a cor (com seu aço escuro) e um peso suavizado por vidraças. Também na Europa fica a de Estrasburgo, França (de Marc Mimram), encaixada na cidade com térreo transparente sustentando blocos contorcidos e empilhados.

Em Coral Gables fica a da Universidade de Miami (do escritório Arquitectonica), uma praça recoberta por graciosa manta ondulada de concreto. E se, como eu, tiver parentes em Byron Bay (perto de Brisbaine, Austrália), veja a escola de Abedian (do CRAB Studio), com sua transparência arejada, tanto visualmente quanto do ponto de vista térmico.

Ou fique aqui pelo Brasil, visitando a faculdade na Federal da Bahia (de Diógenes Rebouças), com traços brutalistas integrados aos espaços livres e à natureza. E se imagine jovem, sendo provocado por esses espaços.

Fonte: Folha de S.Paulo