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3 roteiros pelo centro de São Paulo partindo de estações de metrô

Prodígios arquitetônicos, novidades e tradições gastronômicas, programas culturais, pequenas aulas de história e detalhes pouco conhecidos. Meu, para quem sabe ver, o Centro de São Paulo é uma delícia! Propomos aqui três roteiros exploratórios pela região – partindo e regressando de uma mesma estação de metrô.

Roteiro 1 – Estação República

O barato começa ainda dentro da estação República, onde está o mural de azulejos Momento Antropofágico com Oswald de Andrade. A graça da obra do paulista Antonio Peticov está na mancha disforme pintada no teto, que reflete em um tubo de inox e forma o rosto do escritor modernista.

Depois de dar uma olhadinha, saia para a Praça da República. Você vai topar com a antiga Escola Caetano de Campos, onde Oswald estudou. Hoje sede da Secretaria de Educação, a edificação é uma das 763 tombadas no Centrão e divide atenção com a feira de artesanato que rola por ali aos sábados e domingos.

Vá até a calçada atrás do prédio, dê uma pausa, olhe pra cima – e note a interessante mistureba de fachadas modernistas e neoclássicas nesse trechinho arborizado do Centro.

Atravesse a rua até o número 137 da Praça da República e você estará na loja Mãe África, bem na esquina. Uma vitrine enfeitada com um grande orixá dá o tom exótico do lugar – que vende produtos de países como Nigéria, Máli e Congo. São camisas e vestidos com texturas coloridas, bijuterias com miçangas, esculturas, móveis, máscaras, vestes rituais. É uma festa, mas com preços às vezes salgados.

A essa altura da sua peregrinação central você terá que tomar algumas duras gastrodecisões. A microrregião está cheia de ótimos lugares para comer. Uma sugestão é caminhar até a Rua Araújo, onde fica a aclamada Casa do Porco do chef Jefferson Rueda. Além do ótimo custo/benefício, o restaurante tem um cardápio extenso, que vai do inventivo sushi de barriga de porco ao tradicional porco com tutu.

Se for um dia de filas, dá pra driblá-las fazendo seu pedido na janela voltada para a calçada, onde as únicas (e boas) opções são o torresmo crocante “porcopoca”e o sanduíche de porco com abacate e maionese de mostarda, pratos a serem devorados ali mesmo, na rua.

Ou então siga para a Rua Bento Freitas, onde Jefferson abriu, juntamente com sua esposa Janaína, o Hot Pork. O colorido restaurante prepara cachorro-quente com salsicha de produção própria e ketchup de maçã.

Se sobrar espaço no estômago, a sobremesa pode ficar por conta da vizinha Sorveteria do Centro, que pertence aos mesmos donos e serve casquinhas altamente instagramáveis.

Outra novidade do pedaço é a Tokyo, balada que quase um ano após sua inauguração continua tendo filas gigantescas na porta. A casa ocupa nove andares de um prédio histórico e tem, além da pista de dança no rooftop, salas de karaokê e um restaurante asiático.

Logo ao lado, o La Guapa vende as empanadas da chef-celebridade Paola Carosella e é outra opção para matar a fome na região.

Visto tudo isso, siga até a Avenida Ipiranga, vire à esquerda, e bum: eis o Copan, ponto grandioso para flagrar a Pauliceia de cima. É que o cartão-postal, projetado em “S” por Oscar Niemeyer, promove tours a custo zero no terraço do 32° andar. Pena que as visitas acontecem só durante semana, uma às 10h30 e outra às 15h30.

Além de ser um prédio residencial, o Copan também guarda muitos sabores. Do famoso expresso no quase cinquentenário Café Floresta ao Bar da Dona Onça da já mencionada chef Janaína Rueda. O lugar é point de (re)leituras tupiniquins, como bolinhos de espinafre e rabada com polenta.

Ainda nesse trecho, pausa para um pouco de cultura. A Galeria Pivô funciona desde 2012 no mezanino que esteve fechado por 20 anos e tem exposições, ateliês, workshops e palestras.

É andar mais um pouquinho pela Ipiranga para alcançar outra construção famosa, o Edifício Itália. Projetado pelo alemão Franz Heep, ele possui 165 metros de altura distribuídos em 46 andares, sendo que o 42° guarda o Terraço Itália.

Ali, sim, a vista é acachapante – e existem três jeitos de curtir esse programaço: a) indo ao restaurante tradicional, onde um prato de risoto ou massa custa mais de R$ 100; b) pedindo uma bebida no Piano Bar, que abre às 15 horas de segunda a sexta e às 12h nos finais de semana; c) pagando R$ 30 para fazer uma visita, que acontece diariamente das 15h às 19h e dá direito a um welcome drink.

Saia do Edifício Itália e vire à direita na Avenida São Luís. Ali você vai passar por calçadas largas (mas com pedrinhas soltas), vai ver portarias lindas de prédios classudos à moda antiga e vai se deparar com um relativamente recente enclave modernoso paulistano.

Por ali, dá para sentar nas mesas na calçada do restaurante Ramona e ver a fauna do Centro ouvindo o rock que vem das caixas. Se a ideia te agrada, espere anoitecer e vá ao vizinho Alberta#3, bar-balada rocker alternativa com pista no subsolo.

Mas, se decidir seguir o roteiro, ainda há muito pra ver. Atravesse a Avenida São Luís e desemboque na Praça Dom José Gaspar. Ali está a Biblioteca Mário de Andrade, um refúgio de silêncio em meio aos barulhos da metrópole.

E também o Paribar, que nos anos 1950/60 era uma latitude de intelectuais, com clientes como Chico, Caetano e até Che Guevara, que, dizem, tomou umas ali em 1961. Depois decaiu, faliu nos anos 1980 e foi ressuscitado, e como, em 2010. Bom mesmo é provar o brunch de domingo ou, no sábado, a feijoada, que também come solta, só que ao som de samba, na Cachaçaria do Rancho ali do lado.

No número 106 da Dom José Gaspar a coisa fica quase, digamos, berlinense. Que viagem é a Galeria Metrópole, esse brinde arquitetônico que mistura uma profusão de espaços descolex à decadência de lojas fechadas (algumas ainda mantêm letreiros das antigas agências de turismo e companhias aéreas que funcionavam por ali)!

Exemplos são a PhD Galeria, que vende roupas com as estampas lisérgicas de artistas como Gabriel Torggler; a livraria Tapera Taperá, com saraus e sessões de cinema de graça; a Selvvva, loja de plantas com espécies penduradas em vidros geométricos e arames retrô; a Caballeros Barbería, para barbas à lenhador; e, por fim, o Mandíbula, bar diminuto que vende LPs e faz baladinhas ao som de Ramones, The Clash, Sex Pistols e afins.

Vencido o tour pop, pegue a Rua Doutor Bráulio Gomes, continue pela Rua Marconi e entre à direita na Barão de Itapetininga, via fechada para carros cheia de ambulantes e de portarias bonitas – da época em que nossos prédios eram deliciosamente batizados com nomes em português.

Ali adiante está a recompensa, logo que a rua se funde com a Praça Ramos de Azevedo: a réplica da Opéra de Paris, ainda que o entorno esteja meio degradado. É o eclético Theatro Municipal, palco da Semana de Arte Moderna de 1922, que tem visitas guiadas de terça a sábado – é preciso reservar o tour no site ou na própria bilheteria.

Melhor ainda é ver uma ópera, um balé ou a apresentação de uma orquestra. Nesse caso, confirma a programação com antecedência pela internet.

No subsolo desse monumento paulistano fica o Bar dos Arcos, que não raro bate três horas de fila – tudo para curtir o espaço com arcos de tijolinhos e balcões iluminados tomando drinks a partir de R$ 30.

À esquerda do Theatro Municial, na 24 de Maio, confira se há alguma exposição ou espetáculo rolando no Sesc, cuja piscina bem no topo do prédio faz sucesso nos dias quentes de verão.

Depois, note que a Galeria do Rock já não é tão rock”n”roll: o térreo é dedicado ao skate, e o subsolo, ao rap e aos salões afro, mas dá para achar camisetas de banda bacanas.

Com ou sem suvenir, escolha a saída da Avenida São João e pare no Ponto Chic – foi ali que, em 1936, nasceu o bauru, lanche com queijos derretidos (prato, suíço e estepe), rosbife, tomate e pepino, até hoje sucesso paulistano.

Termine o passeio no cruzamento das avenidas Ipiranga e São João, agora com faixas de pedestres diagonais para facilitar o vai e vem. Talvez nada aconteça no seu coração, a não ser com a ajuda dos chopes bem tirados do Bar Brahma, gatilho para cantarolar o Caetano. Depois, pegue o metrô República de novo.

Roteiro 2 – Estação São Bento

Basta pisar fora do metrô para avistar o Mosteiro de São Bento, fundado em 1598. Tem missa todo dia, mas a mais legal, até para ateus, é a dominical, às 10 da manhã. É um espetáculo ao som de canto gregoriano e de um órgão de 7 mil tubos.

O Mosteiro, que no último domingo do mês se abre para um brunch concorridíssimo que pede agendamento, agrega uma panificadora com gostosas iguarias, muitas delas doces, mas a preços salgadinhos, caso de pães (R$ 20), geleias (R$ 20) e bolos (R$ 8 o míni, R$ 100 o grande). As belas embalagens rendem lembrancinhas para amigos e parentes. Saí da loja com deliciosos bolinhos de limão Saint Madelene.

Dali talvez você queira conferir os eletrônicos de procedência lotérica da Rua Santa Ifigênia. Se a ideia não for encher sacolas, siga até a Praça Antônio Prado, que tem coreto, artigo raro na capital.

Na praça se impõem os prediões da Bovespa, do antigo Banco de São Paulo (art déco na veia) e do ex-Banespão, que foi construído em 1939 com franca inspiração no Empire State nova-iorquino e agora se chama Farol Santander.

Com a nova administração, o antigo Edifício Altino Arantes voltou à vida. Npo No subsolo, o Bar do Cofre fica no ambiente onde antes funcionou o cofre do Banco do Estado de São Paulo e exige reservas. O 2° ao 5° andar mostram a história do edifício através de uma exposição permanente. Já o 19° ao 24° ficam reservados a exposições temporárias – com exceção do 21°, que se tornou uma pista de skate (temporariamente em manutenção). O 26°, por fim, é o mirante: afinal, o prédio segue sendo o terceiro maior arranha-céu da cidade – o campeão é o Mirante do Vale, no Anhangabaú.

Ótima alternativa para encerrar as propostas de enxergar São Paulo do alto é o Edifício Martinelli, que libera o acesso ao interessante e cheio de puxadinhos terraço do 26° andar diariamente, das 11h às 19h30. A 100 metros de altura, dá para clicar o Farol Santander de frente, fora avistar o Palácio dos Correios, a cúpula da Sé, a floresta da Cantareira ao longe…

De volta ao chão, dedique mais um tempinho à praça. Ali estão instalados quiosques onde é possível engraxar seu sapato à moda antiga, e o clima retrô se mantém no bar Salve Jorge, um tributo boêmio ao santo pagão.

O ponto imperdível da praça, pra mim, é a Casa Mathilde, com seu longo balcão de doces portugueses. É um dilema escolher entre os travesseiros de Sintra e os pastéis de nata, mas o certo é que o mezanino é o lugar mais agradável para comê-los.

Reabastecido, continue a caminhada pela Rua do Comércio. Na onda de barbearias vintage pipocando por São Paulo, repare na pequena Barbearia 9 de Julho, que faz a barba com navalhas e toalhas quentes num salão todo anos 50.

A próxima parada pode ser na Rua Álvares Penteado do neoclássico CCBB, com cinema, teatro (à noite) e que recebe exposições no naipe de Picasso e Van Gogh.

Nada incrível em cartaz? Siga para a Rua Líbero Badaró, para outra inesquecível vivência gastronômica lusófona na Casa Godinho, fundada em 1923 e declarada Patrimônio Cultural Imaterial de São Paulo. É um empório conhecido pelas empadas – a mais pedida é a de bacalhau.

Se sobrar alguma energia e um punhado de trocados, feche o passeio no comércio popular da antropológica Rua 25 de Março, alcançada após mais uma andada via Líbero Badaró-Largo de São Bento. No fim, sacolinhas em mãos, parta pelo metrô São Bento.

Roteiro 3 – Estação da Sé

Faz parte do DNA paulistano reclamar de uma obra do governo que nunca acaba. Até agora, porém, nenhuma supera a vagarosidade da grandiosa Catedral Metropolitana, que levou mais de 50 anos para ficar pronta. Em estilo neogótico e com aquele escândalo renascentista que é sua cúpula, a igreja foi inaugurada em 1954 ainda inacabada só para compor a celebração do quarto centenário de São Paulo.

Mas, que ficou bonita, ficou, como você irá comprovar assim que sair da estação. Lá dentro, dê uma boa olhada nas colunas, que foram adornadas com esculturas de bichos da fauna brasileira, e repare na luz colorida que incide sobre elas, graças à pintura dos 54 vitrais. Lá fora, atente-se aos larápios sem colarinho branco.

Logo em frente, na Praça da Sé, o Marco Zero determina o início da numeração das vias públicas de São Paulo. Dê uma volta em torno do monumento para ver que cada uma de suas seis faces aponta para uma localidade importante do país, como Santos e Rio de Janeiro.

Seu próximo destino, porém, é logo ali: a Barão de Paranapiacaba, que, por ser repleta de joalherias, é a “Rua do Ouro”. No fim dela, pegue à direita na Quintino Bocaiúva e caia numa atração de nome igualmente óbvio, o Edifício Triângulo, projeto de Oscar Niemeyer com um (malcuidado) mosaico de Di Cavalcanti na entrada.

Seguindo pela Rua Direita, logo se veem as colunas jônicas negras da Caixa Cultural, com cinema a R$ 2 e mostras gratuitas.

Ao sair da Caixa, à direita, mantenha-se na mesma calçada: aos poucos, se avista na Rua Roberto Simonsen um palacete cor-de-rosa, o Solar da Marquesa de Santos, onde Domitila se instalou após o término de seu longevo caso com o imperador Pedro I, em 1834. Restaurado, o QG das baladas da elite da época conserva a cama da moça e algumas paredes de taipa de pilão.

Ao lado do Solar há uma passagem que dava acesso à várzea do Rio Tamanduateí na era colonial. A viela foi muito usada pelo povo até que o então dono do pedaço, o brigadeiro José Pinto, decidiu fechar o acesso. Descontentes, os vizinhos apelidaram o local de Beco do Pinto. Para saber de mais causos, veja fotos antigas na Casa da Imagem, colada ao beco e que preserva afrescos.

Ainda na Rua Roberto Simonsen, fashionistas rumam para o brechó chique Casa Juisi, num casarão de 1890 que sediou o primeiro cartório da capital.

Tendo você o perfil que tiver, certo é que seu passeio termina bem onde São Paulo foi fundada: no Pateo do Collegio. Nesse largo, em 25 de janeiro de 1554, padre Manuel da Nóbrega e José de Anchieta, canonizado em 2014, rezaram uma missa que rende até hoje.

É um complexo que junta a igreja, o Café do Páteo – com um jardim agradável, quadros da Sampa colonial e que segue a mesma receita de pão desses primeiros habitantes – e o Museu Anchieta, com a pia em que os jesuítas batizavam os indígenas. Enfim: de programa de índio esses rolês não têm nada.

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Fonte: Viagem e Turismo