As aparências enganam

aparencias As aparências enganamCerta vez, Kleiton e eu estávamos montando um show e na abertura resolvemos incluir a leitura em sânscrito de um mantra indiano. Como ninguém sabia como aquilo deveria ser pronunciado, Benjamim Santos, o diretor do espetáculo, resolveu procurar Antônio Houaiss. O grande filólogo e intelectual era provavelmente uma das poucas pessoas que entendiam de sânscrito no Brasil.

Ao ser perguntado como era a pronúncia exata daquelas palavras estranhas, Houaiss caiu na risada e se saiu com uma pérola:

– Pode dizer de qualquer jeito, ninguém sabe falar sânscrito no Brasil.

É claro que foi uma brincadeira do professor, que em seguida ensinou como deveria ser entoado o mantra.

Lembrei dessa história pois estamos vivendo tempos estranhos, em que não importa o que você fez, mas o que as pessoas acham que você fez. Não importa a coisa em si, mas a imagem da coisa. Ou seja, a aparência é mais importante do que o conteúdo. A embalagem vale mais que o produto.

Por isso o marketing e a propaganda têm ocupado cada vez mais espaço na nossa sociedade, inclusive nas campanhas eleitorais. Criam-se histórias que não necessariamente correspondem à verdade. Tanto faz, o que interessa é vender o produto, vencer a eleição, faturar algum.

Chegamos a um ponto em que muita gente acha que pode agir errado, desde que ninguém saiba disso. Mas, felizmente, também há muita gente que pensa o contrário. Aí depende só de você, da sua consciência, do rigor com que você leva a sério seus princípios e valores morais. Você pode se negar a entoar de maneira incorreta um mantra indiano para milhares de pessoas ou, no outro extremo, abrir um valerioduto para escoar dólares roubados.

Manter uma postura digna, dentro de uma sociedade de consumo desenfreado onde as pessoas são medidas pelo tamanho do extrato bancário, está cada vez mais difícil.

Ao mesmo tempo, é preciso tomar cuidado. Não é o suficiente fazer a coisa certa e não ligar para o que os outros estão pensando. A imagem é importante sim, pois senão corre-se o risco de que a história seja registrada de maneira equivocada. E a versão se torne mais conhecida do que o fato em si. Aquela tal artimanha muito usada de contar uma mentira tantas vezes até que ela acabe virando realidade.

Enfim, o ideal é tentar construir sua vida com uma boa embalagem e um conteúdo de qualidade.

César, o imperador de Roma, um dia repreendeu Cleópatra. Roma comentava a boca pequena que ela levava uma vida libertina.

Cleópatra deu de ombros e disse para César não dar ouvidos a isso. Tudo não passava de boatos.

Foi então que o imperador deu uma aula de comportamento para sua mulher:

– Para a mulher de César, não basta ser recatada. É preciso parecer recatada.

Fonte: Brazilian Voice