Gal Costa fez 75 anos na semana passada. Dela, penso que preciso dizer muito pouco, já que posso
apostar o dedo mindinho dos dois pés que cada um de vocês, que lê esse texto, já a conhece. Já ouviu
sua voz sem defeitos – e, mais impressionante, sem esforço – e já foi exposto, ainda que por vídeo, à
sua presença, em algum palco grande ou pequeno, a fazer o que poucos fazem com a mesma força
que ela: cantar. Ano passado, tive essa experiência, pela primeira vez, ao vivo. Em um teatro
pequenininho aqui em São Paulo. Somente Gal, Guilherme Monteiro e um violão. Foi tão bonito.

No sábado que passou, convencida de que estava de novo em um ao vivo – só que dessa vez nesse
ao vivo virtual que nos é possível – vi e ouvi Gal também aqui em São Paulo, comemorar o próprio
aniversário. Fiquei comovida. Foi um bom show, mas o que me emocionou foi a companhia de
minha filha Lara que na ocasião do ao vivo, vivo mesmo, estava em férias pernambucanas. Lalá
cantou quase todas, sentadinha no chão da sala, repercutindo comigo, com minha mãe e minha tia
cada movimento, escolha de repertório, comentário paralelo tanto de Gal quanto de nosso grupo
que se falava também virtualmente. Tão longe, tão perto.

Quando a transmissão acabou e mainha e tia Lena foram dormir, eu e Lalá buscamos mais Gal no
Youtube e acabamos encontrando um show antigo em que ela convida Elis Regina ao palco. Rapaz,
aí foi grande, viu? Como estavam soltas. Livres. Quase loucas. Que coisa linda.

Estamos lendo em dupla Mulheres que Correm com os Lobos, o clássico de Clarissa Pinkola Estés.
Ainda no primeiro capítulo, a autora nos conta a história de La Loba. Uma velha “que vive num lugar
oculto de que todos sabem, mas que poucos já viram”. La Loba recolhe ossos e canta para

eles. Até que os ossos, pouco a pouco, se forram de carne e músculo. Ela segue cantando e os ossos,
a carne, os músculos, se tornam vida: um lobo, que corre pelo deserto. À medida que corre, ele se
transforma em uma mulher livre. A mulher que ri. A mulher selvagem.

“Por isso, diz-se que, se você estiver perambulando pelo deserto, por volta do pôr do sol, e quem
sabe esteja um pouco perdido – não estamos todos? –, cansado, sem dúvida você tem sorte, porque
La Loba pode simpatizar com você e lhe ensinar algo..”

Já passava de meia noite, mas o que vimos ali, minha filha e eu, foi uma frestinha de La Loba, dos
ossos, do lobo, da mulher de vento no cabelo, da vida. O bis escolhido para o show de aniversário foi
Festa no Interior e nada podia ser mais simbólico do que essa escolha. Que o nosso interior possa
sempre, depois de recolher os ossos, cantar em festa. Viva Gal, viva Elis, viva Lalá, mainha, tia Lena e
eu. Viva a força das mulheres selvagens quando se juntam. Boa semana queridos.

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Fonte: Gazeta News