Como a pandemia afetou o setor cultural e artistas brasileiros na Flórida

Renan Cerdeiro é o bailarino principal do Miami City Ballet. Foto: arquivo pessoal.

Milhares de espetáculos interrompidos há meses. Museus, teatros e centros de artes fechados. Assim como outras áreas, a artística foi bastante atingida pela pandemia do novo coronavírus, tanto que a estimativa de prejuízo gira em torno dos bilhões de dólares em todo o país.

As instituições culturais permanecem em um padrão perigoso de crise e enfrentam um futuro profundamente incerto. Mesmo que alguns tomem medidas provisórias de reabertura, a maioria permanece fechada sem nenhuma data de reativação ainda definida. E mesmo os que já planejam reabrir, enfrentam diversos obstáculos como a falta do público e aplicação das medidas de segurança impostas pelas autoridades de saúde e pelo governo.

Maria Fulfaro, gerente de marketing do Broward Center for the Performing Arts em Fort Lauderdale, falou ao Gazeta News sobre o impacto econômico e os desafios para a área cultural. Segundo ela, o segmento de Performing Arts Centers tem uma estimativa de perda em venda de ingressos em torno de US$ 42.5 bilhões, de acordo com estudo do Brookings Institution.

“O impacto da Covid-19 nas artes é imenso, pois ele interrompeu a produção que gera receita, prestígio e conteúdo e que faz com que a atividade seja mantida. Essa pandemia está muito mais longa do que se previa no começo. Corre o risco dela desabituar o público, que pode demorar para se sentir confortável a participar de eventos, teatros e manifestações culturais que tenham aglomerações. Acredito numa ruptura nos padrões de consumo cultural de alguma forma”, analisa Fulfaro.

E explica que, “na indústria dos performing arts que recebem os grandes espetáculos de dança, concertos, óperas e Broadway, como os do sul da Flórida que são o Broward Center for the Performing Arts, em Fort Lauderdale, o Adrienne Arsht Center for the Performing Arts em Miami e o Kravis Center em Palm Beach, o impacto é imenso, mas estão todos se reestruturando para uma retomada”.

Maria Fulfaro, gerente de marketing do Broward Center for the Performing Arts. Foto: arquivo pessoal.

Segundo Fulfaro, o Broward Center, que antes da pandemia tinha uma agenda de aproximadamente 900 eventos por ano, tem previsão de voltar com sua programação normal nos seus teatros no primeiro trimestre de 2021. “Mas é inquestionável que o cenário artístico está fragilizado e vem se reinventando e passando por muitos aprendizados. Organizações como a Florida Grand Opera, South Flórida Symphony e Miami City Ballet tiveram que reajustar toda programação, e entreter seu público e ‘subscribers’ com eventos virtuais. A Broadway também ajustou sua programação para a Flórida pra começar apenas em 2021.”, complementa Fulfaro.

“A pandemia está afetando diretamente a produção cultural, não só aqui, mas no mundo todo, milhares de espetáculos cancelados deixando a classe artística muito delicada”, afirma.
Capacidade limitada

Os teatros foram os primeiros a fecharem e serão os últimos a abrirem. A reabertura vem em etapas, e é muito importante entender a parte da capacidade limitada imposta pelo governo.

A gerente explica que muitos teatros e seus espetáculos não funcionam com capacidade limitada. “Essa conta não fecha porque a capacidade restrita significa a limitação de quantas pessoas você pode colocar – 30%, 50% da capacidade do teatro – mais o distanciamento físico entre essas pessoas. Então, na verdade, não é 50% da capacidade, é muito mais do que isso”, calcula.

Com a pandemia, o Miami City Ballet acabou cancelando toda sua temporada de 2020 e também a de 2021. “Ou seja, ele só volta em 2022, e nós sabemos que temos vários bailarinos brasileiros que fazem parte dessa organização”, conta Fulfaro. Um deles é Renan Cerdeiro, bailarino principal. Formado em ballet clássico e outros estilos de dança, Renan teve parte da formação e estudos na Escola de dança Alice Arja, no Rio de Janeiro, e no Miami City Ballet School.

Para o bailarino, a rotina carregada de ensaios e apresentações diárias foi mudada para ensaios em casa via ‘zoom’ e aulas para manter a forma física e a condição mental necessárias aos bailarinos. Sem contar a parte financeira também afetada. Mas graças à ajuda do governo federal, que incluiu os artistas do MCB, e o fato dele ter green card, facilitou para procurar outro emprego.
“Eu iniciei um emprego pelas manhãs e estou tentando manter a forma pelas tardes em casa com os treinos. Felizmente, eu tenho a sorte de estar com o green card facilitando assim a procura de emprego fora do MCB e podendo receber auxílio-desemprego, diferentemente de alguns outros bailarinos estrangeiros empregados pela companhia”, diz.

Broward Center for the Performing Arts, em Fort Lauderdale. Imagem: divulgação.

“Quando estaremos prontos para voltar?”

Quando os teatros estarão prontos para voltar a operar e receber o público?”, questiona Fulfaro. E ela mesma traz a resposta. “Essas questões dependem de vários fatores, como treinamento, plano autorizado pelo governo e confiança do público. Essa volta implica em investimento, adequação e treinamento de pessoal. Existem uma série de regras e medidas de segurança que devem ser acionadas e cumpridas de acordo com as autoridades. Os teatros já estão trabalhando para implementar os protocolos de segurança.

Outro ponto é que cada organização tem que submeter ao governo seu plano de reabertura para aprovação”, exemplifica. Um outro componente importante nesta retomada, aponta Fulfaro, são as parcerias com clínicas que asseguram credibilidade e confiança do público. Segundo ela, o Broward Center fechou um acordo com o Cleveland Clinic.

Nova visão

A pandemia já tem mostrado o quanto mudou na vida e na rotina da população. Para Fulfaro, a pandemia criou oportunidades também para inovar, para mostrar uma nova visão, novos investimentos que estão sendo feitos na cultura. “Com certeza todo esse cenário vai mudar muito. É como se a pandemia significasse uma ruptura dos antigos hábitos e a maneira de se relacionar com as atividades culturais podem ser de alguma forma reinventadas”, salienta.

Uma das mudanças diz respeito aos meios digitais. Assim como na educação, com aulas acontecendo de modo on-line, as artes também estão descobrindo uma nova maneira de chegar ao público. “Existe um processo de aprendizado que se acelerou muito com relação às plataformas digitais e até mesmo a tecnologia evoluiu muito em tão pouco tempo. Hoje, as pessoas estão se organizando para oferecer um entretenimento e concertos digitais em diferentes plataformas, o que acabou preenchendo um vazio que poderia ter sido muito pior”, finaliza.

Beatriz, Viviane e Loren-Oliveira em apresentação virtual do Brazilian Voices. Imagem: Beatriz Malnic.

Shows virtuais

Nessa onda de concertos digitais está o grupo Brazilian Voices, do qual faz parte Beatriz Malnic, formada em música pela Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo.

Desde o começo da pandemia, Malnic diz que tem feito shows virtuais e dado muitas aulas de piano e canto online. “Consegui equilibrar meu salário com o aumento de números de aulas. Mas não há nada melhor do que poder fazer os shows presenciais, porém, temos de dançar conforme a música!”, afirma.

Com 14 prêmios, inclusive pelo Brazilian International Press Award, o grupo, fundado em 2001 por Loren Oliveira e Beatriz Malnic, é uma organização sem fins lucrativos que promove a música brasileira nos EUA para um público médio de 19 mil pessoas por ano. Na Flórida, o Brazilian Voices também promove a cultura brasileira em escolas, hospitais, centros de tratamento de câncer, asilos, além dos concertos anuais em teatros e eventos corporativos.

 

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Fonte: Gazeta News