Saiba quais são os golpes mais comuns em viagens e como evitá-los

​Uma pessoa mal-intencionada e um turista desavisado. É desse encontro que nascem os golpes. 

Aplicados nas cidades mais visitadas do mundo, os truques usam das mais diversas técnicas, das simples às mais sofisticadas, para enrolar e tirar vantagens de viajantes.

Se não dá para resolver a má-fé dos golpistas, o negócio, então, é alertar os turistas. Ouvidos pela Folha, viajantes profissionais dividiram as experiências que tiveram com golpes praticados em diferentes destinos turísticos. E também deram orientações de como não cair neles.

“É comum que o brasileiro ache que ninguém vai conseguir passá-lo para trás. Mas o turista é sempre um alvo, em qualquer lugar do mundo, inclusive em países desenvolvidos”, afirma Rafael Sette Câmara, criador do blog de viagens 360 Meridianos.

Mesmo quem, aqui no Brasil, pensa já estar vacinado contra o conhecido golpe do batedor de carteira, quando viaja ao exterior precisa tomar cuidados extras. 

Afinal, lá fora, é maior o número de variáveis com as quais é preciso lidar: admirar o lugar, ler placas em outro idioma, achar o caminho certo e ainda carregar objetos de valor, como câmeras, além de dinheiro vivo e passaporte.

Nos metrôs de Buenos Aires (Argentina) e de cidades europeias, como Barcelona (Espanha), Roma (Itália) e Paris (França), é comum que quadrilhas preparem armadilhas para viajantes em estações próximas a pontos turísticos.

Em uma dessas situações, uma pessoa deixa cair um objeto na saída da escada rolante e se agacha para pegá-lo, criando um tumulto. Então, o turista fica preso na aglomeração, e o criminoso que vem atrás aproveita para furtá-lo, sem que ele perceba.

Em outro caso parecido, um indivíduo derruba um cartão na porta do vagão do metrô e, ao abaixar para apanhá-lo, bloqueia a passagem. O intuito é separar pessoas que viajam juntas —uma consegue entrar no trem e a outra fica do lado de fora.

Preocupado em não se perder do companheiro, o passageiro de dentro do vagão não nota que seus pertences estão sendo levados.

Isso aconteceu com o fotógrafo Marcio Nel Cimatti, autor do blog de viagens A Janela Laranja, e seu pai, no metrô de Paris. Mas, como Marcio já sabia da tática, percebeu a tempo e conseguiu recuperar a sua carteira.

“Contando como eles fazem, parece que demora, mas é um piscar de olhos. Se a pessoa está desatenta, nem sabe o que aconteceu”, afirma ele.

Também na capital francesa, o jornalista e apresentador Zeca Camargo, colunista da Folha, já presenciou turistas caindo no truque do jogo dos três copos (a pessoa precisa adivinhar qual deles esconde uma pedra ou uma moeda).

Aqui, há duas formas de enganar o viajante. Na primeira, ele vê que outra pessoa acerta o tempo todo, acha o jogo fácil, aposta dinheiro e perde tudo. Na segunda, ele fica tão distraído assistindo à movimentação, que se esquece de vigiar os seus pertences.

Zeca não caiu nessa, mas já foi vítima de um dos mais clássicos golpes de viagem, aplicado por um taxista desonesto em Buenos Aires.

O jornalista pagou pela corrida e saiu do carro. Segundos depois, o motorista foi atrás dele, mostrando uma nota e dizendo que era falsa. Constrangido, Zeca deu uma nova cédula ao homem. “Na hora, não percebi que era um golpe. Você é pego de surpresa e acha que está errado.”

O momento em que o turista fica mais vulnerável a artimanhas de motoristas mal-intencionados é na chegada ao destino. Ele está cansado do voo e ainda não tem muita ideia de como as coisas funcionam no lugar —principalmente, não sabe fazer de cabeça a conversão de moedas.

“O taxista fala um valor e você não tem noção se é muito ou pouco”, diz Rafael, do 360 Meridianos, que foi enganado ao pegar um táxi na chegada a Xangai, na China. 

Ele já havia pesquisado o valor da corrida até seu hotel. Na chegada, o motorista cobrou um valor muito além do estimado. Rafael questionou o homem, que, depois de berrar, aceitou receber metade da quantia —ainda alta.

“Se eu não tivesse pesquisado, o prejuízo teria sido pior”, afirma. Ele recomenda que o viajante se informe com antecedência sobre qual o melhor meio de transporte para fazer o trajeto do aeroporto até o local de hospedagem.

Se for de táxi, uma opção é usar sites que simulam o preço da corrida em diferentes cidades do mundo, de forma aproximada. A ferramenta que ele utilizou foi o Taxi Calculator (taxi-calculator.com).

Outra tática adotada pelo mesmo taxista de Xangai foi parar longe da porta do hotel, para impedir que Rafael pedisse ajuda. Então, é importante pedir ao motorista que estacione em frente ao local.

Para escapar de ciladas em táxis, vale tomar outros cuidados: pagar com trocado e iluminar a nota na hora de entregá-la, mostrando o seu valor.

E mesmo quem viaja com carro próprio ou alugado está sujeito à ação de golpistas. Na volta ao mundo que fizeram de jipe, Leonardo e Rachel Spencer passaram apuros em Viña del Mar, a 122 km de Santiago, no Chile. 

Eles estacionaram o veículo para tirar fotos na praia e, quando voltaram, o pneu dianteiro estava furado. Enquanto Leonardo trocava a peça, um casal pediu a Rachel que fizesse um retrato deles.
Depois que já tinham saído com o carro, perceberam que uma bolsa com equipamentos eletrônicos havia sumido. 

Na polícia, Leonardo e Rachel descobriram que esse golpe é recorrente na região. Os criminosos furam os pneus de veículos que podem ter bens de valor. Na retirada do estepe e das ferramentas para fazer a troca, o viajante coloca no chão bagagens e outros itens, que acabam sendo levados quando seus donos estão distraídos.

Há seis anos, Leonardo, administrador, e Rachel, economista, mantêm o projeto Viajo, Logo Existo. Eles já passaram por 121 países —primeiro, de carro e, agora, de avião. Em mais de um lugar, tiveram problemas com guias  e taxistas que combinavam um valor para um passeio e, no fim, cobravam outro preço.

“Usam a diferença da língua e falam que você entendeu errado: ‘thirteen’ (13) vira ‘thirty’ (30), por exemplo. Você se sente constrangida e paga”, afirma Rachel.

Por isso, eles adotaram o hábito de escrever o valor em um papel ou na calculadora do celular sempre que negociam um serviço. Assim, não há mais espaço para dúvida.

Outro golpe frequente em diferentes destinos é o da atração turística fechada. Uma pessoa, que muitas vezes até usa um crachá de identificação, avisa o visitante que o lugar não está aberto por algum motivo. A mentira tem como intuito vender outro passeio.

Isso aconteceu com Rafael no Grande Palácio Real, em Bancoc, na Tailândia. “Como já sabia da história, não caí.” 

Nesses casos, a saída é sempre checar se de fato o problema existe. O que também facilita é comprar um chip de internet, para poder fazer consultas a qualquer hora, sem depender de wifi.

Para quem viaja sem companhia, as precauções para evitar truques devem ser redobradas, diz a escritora Gaía Passarelli, autora do livro “Mas Você Vai Sozinha?” (Editora Globo, 176 págs., R$ 39,90).

Um bom começo é não andar nas ruas olhando um mapa ou o celular. “Todo o mundo se perde quando está viajando, mas é ruim ficar em uma situação muito exposta.”

Melhor entrar numa loja ou num restaurante para checar o caminho. “É preciso sempre saber a situação em que você está se colocando e ter uma postura segura”, diz Gaía.

Para Rafael, é importante ficar atento a pegadinhas, mas isso não pode impedir a interação com as pessoas e a cultura local. “Tem bastante golpe, mas também há muita gente disposta a ajudar.”

No Rio, fraude no cartão de crédito é golpe mais reportado

No Rio, cidade brasileira mais visitada por estrangeiros, o crime mais reportado à polícia por viajantes, além de furtos na praia, são fraudes envolvendo cartões de crédito, segundo a delegada Bianca Rodrigues, da Deat (Delegacia Especial de Apoio ao Turismo).

Em geral, o golpe é aplicado de duas formas. Uma delas é por meio do dispositivo conhecido como chupa-cabra, que clona os dados do cartão. A outra é mais simples: como muitos cartões estrangeiros não exigem senha, vendedores e taxistas desonestos digitam dois zeros a mais no valor e confirmam a transação, sem o turista perceber. 

Há ainda uma outra pegadinha que, segundo Bianca, voltou a acontecer, depois de meses sem denúncias. 

Na região do largo do Machado (zona sul), ponto de venda de passeios ao Corcovado, um falso guia cobra adiantado cerca de R$ 700 para levar o viajante a várias atrações turísticas. Depois de deixá-lo na primeira, some.

A designer belga Gala Furchbrich, 27, que, desde 2014, vai ao Rio duas vezes ao ano para ver o namorado, conta que está acostumada a lidar com vendedores que, ao notarem seu sotaque, sobem os preços de mercadorias. “No começo, eu não falava português direito. Mas, desde o momento em que consegui me expressar melhor, passei a contestar.”

Veja 5 ciladas vividas por viajantes brasileiros ao redor do mundo

Motorista de táxi sequestra bagagens em Milão, na Itália

No mês passado, ao descer no aeroporto de Malpensa, na área de Milão, na Itália, a estudante Sttela Vasco, 25, pegou um táxi até a estação central da cidade, onde ela e a avó pegariam um trem.

Ao chegar à estação, o taxista saiu do carro e cobrou a corrida. Quando Sttela pediu para que ele pegasse as três bagagens no porta-malas, o motorista apontou para uma placa com o desenho de uma mala e mandou que as duas esperassem ao lado dela. Então, ele entrou no veículo e foi embora.

Sttela achou que a sinalização indicasse o local correto para o descarregamento. “Na hora fez sentido”, afirma.

Ela fez registro da ocorrência e conversou com taxistas no aeroporto. Depois de um dia, o homem foi localizado.

O motorista combinou, então, de encontrá-la no aeroporto. Quando chegou ao local, porém, não estava com as malas. Para reaver os pertences, as duas tiveram de ir com o taxista à casa dele, em uma cidade próxima a Milão. Como elas não sabiam onde estavam, voltaram com o motorista, que cobrou pelas duas corridas.

“Não quis ir de novo a polícia, seria a minha palavra contra a dele. Ele falou que eu tinha esquecido as bagagens, mas sei que não.”

Casa de câmbio na Indonésia tem gaveta para esconder dinheiro

Na ilha de Nusa Lembongan, que fica próxima a Bali, na Indonésia, é comum que lojas de conveniência ofereçam o serviço de câmbio para os turistas. Numa viagem ao lugar neste mês, o empresário Felipe Ventura, 30, recorreu a um desses mercados para trocar dólares pela moeda local, a rupia indonésia.

Na hora de entregar o dinheiro, o atendente contou as cédulas na frente de Felipe.
Antes de sair da loja, o empresário decidiu checar as notas mais uma vez. Então, percebeu que estavam faltando 100 mil rupias (R$ 28). 

Felipe voltou para reclamar e ouviu do funcionário que a contagem estava certa. O homem ainda afirmou ter outros clientes para atender e, portanto, não faria a rechecagem.

Segundo relatos de outros turistas, o truque é comum na região. Ao contar o dinheiro, o atendente deixa algumas notas caírem em uma gaveta escondida atrás do balcão.

Como, em geral, a transação envolve um número alto de cédulas e a moeda do país tem muitos zeros, o visitante não percebe a fraude. Ou, se percebe, tem dificuldade para contra-argumentar.

“Tomei um prejuízo de 100 mil rupias e não consegui reverter a situação”, diz ele.

Em Roma, fotógrafo foge antes de casal ver o resultado de retrato

Visitando a Fontana di Trevi, em Roma, à noite, a publicitária Isabela da Câmara, 25, e seu namorado procuravam alguém que pudesse tirar uma foto deles com o monumento iluminado ao fundo.

Um fotógrafo, então, se ofereceu para registrar o casal com sua câmera do tipo Polaroid, de impressão instantânea —ou quase. Ele posicionou os dois em frente à fonte e prometeu como resultado uma bela imagem.

Feito o retrato, o rapaz entregou a foto ao casal e afirmou que precisava ir embora, insistindo para receber seu pagamento antes que a imagem fosse completamente revelada. O preço combinado foi € 5 (R$ 22).
Aos poucos, a imagem dos dois foi ficando cada vez mais nítida, mas o fundo continuou escuro, por causa da baixa luminosidade do horário e da qualidade da câmera. Resultado: nada de Fontana di Trevi na fotografia.

“Para quem faz a visita de manhã, isso não deve ser um truque, porque o dia está claro. Mas, para o turista que vai à noite, é golpe”, afirma Isabela, que fez a  viagem à Itália no começo deste ano. 

Taxista cobra tarifa extra e troca cédulas em Santiago, no Chile

Em abril, o publicitário Marcelo Pagnoncelli, 32, pegou um táxi, à noite, em frente ao shopping Costanera Center, um dos maiores de Santiago, com duas amigas. Na chegada ao hotel, o taxímetro marcava 3.000 pesos chilenos (R$ 17). 

Então, o motorista disse que a corrida, na verdade, tinha custado 8.000 pesos (R$ 46), por causa de uma suposta tarifa extra cobrada por táxis que ficam no centro de compras. 
“Relutamos, mas, por causa do horário, pagamos”, conta.

Ele deu uma nota de 10 mil pesos (R$ 58) ao taxista. Como estava escuro no carro, o motorista acendeu a luz ao receber o dinheiro, mostrou uma cédula de mil pesos (R$ 6) e disse que Marcelo havia dado a nota errada.

“Como estava cansado, achei que pudesse ser verdade”, diz ele, que deu mais 10 mil pesos. O trio percebeu depois que tinha caído em dois golpes. Além de cobrar a mais, o taxista havia trocado a nota de 10 mil por uma de mil. O truque é tão recorrente em Santiago que tem até nome: “cambiazo”.

“Depois de alguns minutos fora do carro, caiu a ficha e veio aquele sentimento de ter sido enganado, o que faz com que o turista veja a cidade de outra forma.”

Homem finge ser funcionário de estação em Paris

Sem falar francês ou inglês, a aposentada Soraya Pamplona, 56, tentava comprar uma passagem de trem em uma máquina na Gare du Nord, em Paris, uma das estações mais movimentadas da Europa.

Acompanhada do marido e da cunhada, ela procurava o bilhete de ida até o aeroporto de Orly, em 2015.

“A gente estava com um pouco de dificuldade, não sabia mexer direito nessas máquinas”, conta Soraya.

Foi quando um homem, com colete e crachá, ofereceu ajuda. Pensando que se tratava de um funcionário, eles aceitaram o auxílio.

Para fazer a compra, o rapaz inseriu o cartão de crédito de Soraya na máquina, mas houve um erro na transação. Então, ele se ofereceu para passar o próprio cartão e cobrou o valor em dinheiro, mais uma taxa de € 10 (R$ 45). “Aí percebemos que tinha algo esquisito, mas pagamos”, diz. “Depois, pensamos que ele não deve ter inserido direito o nosso cartão de propósito.”

Eles saíram com os tíquetes e seguiram viagem. Quando chegaram à estação em que pegariam o trem para o aeroporto, descobriram que o bilhete não dava direito ao trajeto. Tiveram, então, de comprar novas passagens.

“Ficou uma lição: ninguém aparece assim, do nada, para ajudar.”

Fonte: Folha de S.Paulo