Maratonista brasileiro é patrocinado pela solidariedade humana para a 43ª Maratona de Chicago

“Tudo é fruto que a gente vem plantando, eu venço o sofá, eu venço a preguiça, eu venço o chocolate. Eu tenho os meus sofrimentos, mas o retorno é maior”, diz Geison Rodrigues

Dono de um impressionante currículo esportivo, protagonista de uma história inspiradora. Levou uma queda, se quebrou, foi ao fundo do poço, se encorajou e saiu correndo para encontrar o que a vida tem de melhor a oferecer. Esta é a história de um atleta vencedor, que apesar das honrarias é relegado pelas políticas públicas esportivas do Brasil, mas encontrou na solidariedade, razões para continuar a correr. O maratonista Geison Rodrigues fala ao Brazilian Times um pouco sobre as suas lutas, conquistas e perspectivas futuras.

Corre maratonas, pratica atletismo e duathlon; para além do esporte, é palestrante, rotariano e ativista. Convidado a participar da 43ª Maratona de Chicago 2021, nos Estados Unidos, no domingo dia 10 de outubro, como atleta da Achilles Internacional, ele vai representar a nossa nação no Programa Adaptativo da Maratona de Chicago, considerada a segunda maior do mundo. Trata-se de um evento de dimensões internacionais o qual irá reunir 40.000 mil participantes, 9.000 mil voluntários de apoio à prova, e milhares de expectadores vibrando e incentivando os corredores nas ruas. Geison Rodrigues vai receber o apoio da Maratonista Americana Lauren Donnelly durante todo o percurso como guia na prova. O atleta que já participou de duas maratonas em Nova York, vai representar o Brasil mais uma vez, graças à solidariedade de outros brasileiros que estenderam as mãos para ele continuar a corrida.

Geison também pratica duathlon

Geison Rodrigues foi acometido pela Covid-19, duas vezes, nesse ínterim, perdeu os patrocínios, todavia chegou o momento tão esperado, a Maratona de Chicago 2021. Com poucos recursos econômicos para custear a viagem, com o apoio dos amigos foi feito uma vaquinha nas redes sociais, no entanto, conseguiu arrecadar apenas 50% do valor necessário, mas ele não desistiu. Por meio das redes sociais externou ao mundo o seu desejo de competir. Sua voz ecoou no México e o brasileiro Gabriel Vieira Storino, ex-jogador de futebol e dono da pousada Boungainvillea no México ofereceu-lhe abrigo para cumprir o período de quarentena. É que, durante este tempo de pandemia, toda pessoa que viaja aos Estados Unidos deve cumprir um período de 15 dias de quarentena em outro país, antes de entrar no território Americano.  Entrou para esse time o tatuador brasileiro Leo Mayer, que vive em Chicago, ele também ouviu o apelo do atleta e ofereceu hospedagem para Geison durante o período da maratona.

Sobre a expectativa para a Maratona de Chicago 2021, Geison se diz muito animado, apesar de falar pouco o idioma, mas isso não representa uma barreira para o extrovertido atleta: “Como bom nordestino que sou, primeiro me preocupei em aprender a pedir comida e água. Consigo me comunicar um pouco. Isso para mim não é barreira não. Graças a Deus, onde chego faço amigos, as pessoas não querem me largar, sou muito amigável. As pessoas gostam de ficar colados comigo. Essa é uma das grandes conquistas que o esporte me trouxe”.

Geison Rodrigues ficou mundialmente conhecido depois de receber algumas importantes homenagens em reconhecimento ao seu desempenho esportivo. Em 2016 recebeu o título de Embaixador do Team Unicef do Brasil. Foi convidado pela Achilles Internacional para participar da Maratona de New York City por dois anos consecutivos, 2018 e 2019.

Em 2019, recebeu uma premiação de nível global sendo eleito um dos atletas de excelência pela Global Sports Development. Uma conceituada instituição americana. Além disso, foi indicado ao Oscar esportivo pelo pódio Pernambuco. Uma premiação concedida aos melhores atletas do estado de Pernambuco.

Os últimos cinco anos tem sido muito intenso para o atleta, ele conta sobre como começou a ser convocado para participar de competições tão relevantes para a sua vida. “Eu comecei a ser observado no processo de corrida em 2017 fui convidado para entrar para os jogos paralímpicos. Passei por uma banca examinadora, recebi a minha classificação e hoje me mantenho no ranking no Brasil dos 800 metros. E nos 1.500. Na sexta-feira, antes de vir para o México cumprir a minha quarentena eu consegui medalhar em um bronze nos jogos universitários”. Conta entusiasmado.

O esporte é superação, é vida_

Aos 45 anos de idade, vive em união estável, tem um filho adolescente de 16 anos. Mora na cidade de Jaboatão, em Pernambuco. Ao ser perguntado sobre a idade, ele brinca, e diz que essa seria a questão mais difícil de se responder. Mas imediatamente adverte que, para correr não existe idade, tem uma amiga de 95 anos que participa de corridas. Sobre a sua dinâmica de treinamento, declara que a rotina é bem puxada, depois de uma jornada de trabalho o dia inteiro em uma empresa, somente à noite sob o olhar da lua é que realiza os treinamentos diários.

“Geralmente o treino começa às 19h, minha rotina de treino é intensa, acelerada. Isso é um catalisador para a gente alcançar o que vem alcançando”. Esclarece ainda que o treino é diário, quando não pratica corrida, treina fortalecimento muscular em academias, quando não treina para maratonas, treina para o atletismo, porém, garante que reserva dois dias lights para não se lesionar.

                A história do atleta é muito impressionante, ele conta que depois de sofrer um grave acidente de moto em 2006, teve fraturas no quadril, levando-o para uma cadeira de rodas. Esse acidente empurrou-o para o fundo do poço, lá ele experimentou a depressão. O médico disse que ele não mais andaria, mas o doutor não conhecia o seu paciente, tão teimoso, insistente e irreverente, o qual se recusou a ouvir os conselhos da medicina conforme descreve.

 “Eu penso que as pessoas não podem dar sentenças, eu fui sentenciado a ser um cara inativo. Por algum momento eu acreditei nisso, até que um dia, fui assistir uma corrida de rua e lá eu vi pessoas com diversos biotipos, vi pessoas obesas, vi pessoas amputadas de prótese, vi idosos, então eu me imaginei naquela condição. Se eu não estivesse saído de casa para assistir a uma corrida atendendo aos conselhos de alguns amigos, eu talvez estivesse hoje como os médicos imaginaram que eu poderia estar, paralisado. Ali eu achei que era capaz, eu comecei caminhando nas corridas. O meu sonho era fazer uma corrida de cinco Km, e aí eu trotava dentro da corrida de 5km. Eu fazia em quase duas horas. Depois eu vislumbrei uma corrida de 10km, corri sem parar. Depois eu sonhei correr 21km. Daí a junta médica falou: “Esse aqui é o cara que desenganou a medicina”. A fé leva a gente para lugares inimagináveis”. Confessa.

O esportista conta que, depois de ter assistido a um vídeo da Maratona de Nova Yorque, ou seja, a maior maratona do mundo, ele vislumbrou participar dessa competição. Foi em 2018 que ele participou da Maratona em Nova York, sendo essa a primeira Maratona de sua vida. O atleta garante que a saúde física está top 10, apesar da Covid-19 reincidente, ele conta que se recuperou bem.

Muitos esportistas aproveitam os eventos para protestar contra alguma coisa ou para celebrar algo. Além da bandeira do Brasil e de Pernambuco, o maratonista carrega também a bandeira do ativismo. Sensível às questões sociais o atleta fala empolgado de suas causas: “Alguns enxergam essa posição como vitrine e eu a enxergo como um canal de causas, onde tenho a oportunidade de defender algumas bandeiras. Um dos projetos principais que defendo é a inclusão. A gente percebe que o mundo hoje está mudando o foco no esporte e principalmente no aspecto do esporte inclusivo”.

Outro tema que preocupa o esportista é a desigualdade de gênero, ele aproveita o momento para denunciar a desigualdade no esporte: “Uma coisa que a gente percebe no Brasil e no mundo é a questão da posição das mulheres nas corridas. Elas correm as mesmas distâncias que os homens, mas quando ganham o prêmio em dinheiro, a premiação dela é sempre menor. Eu acho isso uma discriminação, eu não acho isso igualitário e mesmo sendo homem eu não me sinto confortável diante desse cenário. No Brasil, eu tenho combatido muito junto aos organizadores para que haja este nível de igualdade para que haja uma verdadeira democratização no esporte”.

Ainda neste cenário de preocupação com a realidade social não somente brasileira, mas internacional, ele se preocupa com uma doença que já fora erradicada nos países desenvolvidos economicamente, mas que insiste em afetar crianças nos países desprovidos de recursos econômicos: “Uma outra causa que advogo é da Poliomielite, eu fui embaixador do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), no Brasil em 2016, mas é uma causa que eu ainda trago comigo, estou na luta para a erradicação da pólio no mundo. É uma das causas que o Rotary abraça, eu fui embaixador desse projeto para o Rotary. Considero essa causa muito relevante porque praticamente o mundo todo já está erradicado dessa doença, mas recentemente soubemos de casos. Essa é uma das causas que eu defendo e abraço”.

O maratonista esbanja confiança e otimismo. Conta que, depois de ter atuado como capitão do Brasil na Copa do Mundo de Corrida, tornou-se bastante conhecido, por isso acredita que em todo mundo vai ter alguém que o conheça. Os amigos ficam torcendo para ele ir correr em seu país para que possam prestigiá-lo: “Essa, para mim, é uma das maiores conquistas. Eu já tenho medalha de ouro no currículo, já tenho medalha de prata, mas o maior legado é o que a gente constrói na vida das pessoas, nas próximas gerações, nas gerações atuais. Acho que isso tem mais valor que medalhas e troféus”.

Outra reflexão importante que o atleta apresenta é sobre os valores materiais e os valores humanos: “Eu aprendi que, um dia os meus troféus serão jogados no lixo pelos meus bisnetos e tataranetos. Esses não terão a oportunidade de ter contato comigo, mas o legado que a gente constrói é o mais importante. Você encontrar com as pessoas no aeroporto, no shopping e ouvir as pessoas dizerem que você fez a diferença na vida dela, que ela entrou para o mundo do esporte porque você foi a inspiração. Isso para mim é imensurável, isso não tem preço”.

Pernas do amor. O objetivo é incluir pessoas com locomoção reduzida_

Diante da dificuldade de se conseguir financiamentos para praticar o esporte e participar de competições, o maratonista lamenta a falta de políticas públicas de incentivo ao esporte no Brasil. “A gente percebe que está havendo um desmonte no esporte. Lamentavelmente tenho amigos atletas que estão vendendo as medalhas olímpicas de ouro, tem um atleta vendendo a medalha de ouro para comprar leite para o filho. Tenho amigos atletas que estão vendendo as medalhas para comprarem o enxoval dos filhos. Outros abandonaram a carreira por questão de idade e de lesão, estão trabalhando vendendo água mineral na rua. O país não tem a política de fazer a transição como os países de primeiro mundo fazem. Eles pegam os atletas que já medalharam e utilizam eles para serem embaixadores nas escolas públicas para incentivarem as novas gerações, trabalham com eles como auxiliar técnico nos comitês olímpicos e paraolímpicos. No Brasil não existe essa política de transição dos grandes atletas que já foram consagrados em nosso país.

Quanto aos projetos futuros, Geison revela que deseja publicar um livro e conta que planeja aplicar para o Guinness Word Records e cumprir o desafio de ser o primeiro maratonista brasileiro a executar uma maratona em cada continente, em um tempo total inferior a 29 horas. Para concluir a conversa, Geison Rodrigues deixa uma mensagem para as pessoas a partir da sua experiência de vida e em especial com o esporte. “Estamos em um mundo bipolarizado. Acho que o esporte é uma das ferramentas que deve ser utilizada como catalisador do bem, de paz e que o esporte salva vidas. Posso dizer isso porque eu gosto do projeto que criei, o projeto se chama “Pernas do amor”. O qual visa pegar as pessoas com locomoção reduzida e incluir nas corridas de rua. Falta palavras para descrever o que é o esporte. O esporte é superação, é vida.

A fé leva a gente para lugares inimagináveis

Fonte: Eliana Marcolino

Fonte: Brazilian Times