Palavras novas são inventadas o tempo todo. Não é possível precisar a data de nascimento do neologismo “instagramável”, mas pude ter uma ideia com uma busca rápida no site da Folha e na minha própria caixa de e-mail.
Na Folha, a primeira menção ao termo é de agosto de 2018. Nas minhas mensagens, ele surgiu pouco menos de um ano depois, quando o instagramável estreou com tudo. Veio num press release cuja linha de assunto era: “Hambúrguer de churros ‘instagramável’ é aposta de bistrô para conquistar likes e paladares”.
Para um hambúrguer de churros, basta existir; nem precisa de “instagramabilidade” ou conquista de likes para chamar a atenção pelo absurdo. Mas vamos nos concentrar no tal do instagramável.
Ser instagramável significa oferecer cenários e objetos –comida, no caso dos restaurantes– que rendam fotos de sucesso na rede social Instagram. Sucesso no Instagram é o chamado engajamento, o quanto uma publicação atrai de interação de outros usuários da rede.
Seria imbecil negar a importância da aparência da comida. Desde sempre, a apresentação dos pratos é um fator determinante na escolha por picanha ou feijoada, sushi ou lasanha.
Muito legítima é a preocupação de um restaurante em oferecer pratos bonitos, portanto atraentes, assim como ambiente e iluminação adequados para que os clientes fotografem, filmem e postem no Instagram. A divulgação espontânea da freguesia é uma ferramenta de que ninguém mais pode prescindir.
Daí até usar a palavra “instagramável” como chamariz, vai uma enorme distância.
Quando você anuncia que a casa e o que ela vende são “instagramáveis”, você eleva o fuzuê das mídias sociais a um nível de prioridade que não lhe cabe.
Restaurantes existem para servir comida –e a qualidade da comida deve vir antes de quaisquer outros predicados. Serviço, ambiente e até preço vêm depois. Donuts de pônei com glitter e mojito com marshmallow de unicórnio, se é que têm algum valor, deveriam valer apenas pela curiosidade.
O restaurante instagramável não deveria existir. Esse papo é só mais uma vertente da praga das “experiências gastronômicas”, conversa furada e quem não tem nada de sólido para entregar.
Jantar num ambiente instagramável para instagramar e ganhar likes equivale a ir ao motel para ver o jogo do Brasileirão no canal pago da TV de 96 polegadas suíte Luxúria. A comida fica em segundo plano.
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Fonte: Folha de S.Paulo