A vida íntima dos chefs de cozinha

A notícia da separação do casal de chefs Janaína e Jefferson Rueda, da Casa do Porco, passou 13 horas em primeiro lugar na lista dos textos mais lidos do site da Folha. Publicada na coluna de Mônica Bergamo na noite de terça-feira (16), a nota permaneceu entre os 20 assuntos mais populares do jornal até a tarde de quinta.

A pergunta que me martela a cabeça é: desde quando a vida íntima dos cozinheiros desperta tanto interesse na população em geral?

Jana e Jeffim são a realeza da gastronomia brasileira. Seu restaurante foi eleito o 7° melhor do mundo, na lista da água San Pellegrino. Estão superexpostos. É natural, em certa medida, que atraiam atenção e inveja.

Vamos a outro exemplo.

A mesma coluna soltou, na quarta-feira (17), outra nota sobre um quiproquó envolvendo os irmãos Fasano –sócios na marca de restaurantes e hotéis de luxo que leva seu sobrenome. O texto também entrou para os cinco mais lidos.

Embora a marca Fasano tenha um recall absurdo, os irmãos litigantes são pessoas relativamente reservadas. Gero (ex-Rogério), a imagem pública do grupo, arrebanha menos de 10 mil seguidores no perfil de Instagram. Apenas um punhado de pessoas ricas, jornalistas e deslumbrados sabem quem ele é.

Assim como o futebol e o gim tônica, o jornalismo de mexericos foi inventado pelos ingleses. Intrigas palacianas sempre existiram por todo canto, mas a Inglaterra reunia dois fatores que adubaram a horta das fofocas impressas a partir do século 19.

Era a nação mais rica e mais industrializada do mundo, o que fez nascer uma imprensa viçosa. E ainda é uma sociedade monarquista de castas –plebeus compraram montanhas de jornais a expor os podres da família real e seus satélites.

Como nem todo mundo tem nobreza para espinafrar –e todo “bully” sabe que malhar o mesmo judas cansa a plateia depois de algum tempo–, os fofoqueiros profissionais precisaram escolher outros alvos.

A classe artística, sempre tresloucada na visão do anônimo ressentido, entrou primeiro na mira. Depois vieram os jogadores de futebol e outros esportistas –gente que ousou transcender a condição de pobreza ou quase pobreza.

Com a invenção da internet, qualquer um ficou elegível à celebridade e seus efeitos colaterais. Não é preciso ter habilidade nem talento, basta soprar a flauta na nota certa –o que muitos fazem por instinto ou por acaso. Surgiram novas categorias de famosos: participantes de reality shows, influenciadores, DJs, coaches.

O bruto ambiente das cozinhas ganhou um lustre nas últimas décadas. Alçaram os cozinheiros à fama. A classe colheu os louros e, como demonstra o caso Rueda, teve de lidar com alguns galhos espinhosos.

Ninguém está interessado de fato nos dramas pessoais do casal Casa do Porco. A repercussão da fofoca tem mais a ver com a nossa compulsão por consumir qualquer porcaria para aplacar o tédio infinito. Usar os reveses alheios como distração de uma vida repleta de estímulos e vazia de propósitos.

Estamos mortos, só esqueceram de nos avisar.

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Fonte: Folha de S.Paulo

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