Cultura caipira e natureza cativam turistas no Vale do Paraíba

De dentro dos automóveis e ônibus que percorrem diariamente os 400 quilômetros da BR-116, é difícil imaginar a riqueza da região que margeia o rio Paraíba do Sul.

Com São Paulo em uma ponta e Rio de Janeiro na outra, a rodovia Presidente Dutra corta pequenas cidades do Vale do Paraíba, onde construções históricas, belezas naturais e a essência da cultura caipira formam um pacote de atrações para o turista.

Conhecer a história do Vale do Paraíba é essencial para o turista entender o que vê. Coberta originalmente pela mata atlântica, a região foi devastada pelos cafeicultores no século 19.

Nas fazendas dos barões formaram-se fortunas, mas o descuido com a terra cobrou seu preço: na virada para o século 20, fazendeiros falidos e terrenos exauridos levaram o Vale do Paraíba a um longo período de abandono, que só começou a ser revertido recentemente.

De certa forma, essa fase de decadência –que o escritor Monteiro Lobato retratou no livro de contos “Cidades Mortas”, de 1919– ajudou a forjar a identidade ao lugar.

Sem recursos, longe das modernidades trazidas pelo progresso, pequenos municípios preservaram tradições que, agora, fazem sucesso entre os visitantes —que os novos empreendimentos turísticos aprenderam a explorar.

É o caso da Fazenda Santa Vitória, localizada em Queluz, São Paulo, perto da fronteira com o Rio. Construída em 1850, a propriedade de quatro mil hectares mudou de mãos em 2016.

Virou um luxuoso hotel-fazenda, com suítes, casas para hóspedes e heliponto. No restaurante, porém, o sotaque é caipira. O menu do chef Alex Sander Lopes se baseia em legumes e verduras da horta, produtos da queijaria própria e pratos emblemáticos da região, como a farofa de içá, formiga rechonchuda que fica crocante depois de frita.

Os dias no vale passam devagar, mas não por falta do que fazer. Passeios em meio à natureza concorrem com uma programação cultural intensa, que envolve festejos de rua ao longo do ano todo.

Não são raros os festivais de moda de viola. Festas populares de cunho religioso mesclam apresentações de danças tradicionais e bastante comilança. Mas nada se compara ao agito que toma conta do vale no Carnaval.

Em São Luiz do Paraitinga, o Festival Nhô Frade de Marchinhas começou no fim de janeiro e, no Carnaval, os blocos de rua vão circular novamente pelo centro histórico, após dois anos de pandemia. A prefeitura da cidade espera receber de 15 a 20 mil visitantes por dia.

Em São José do Barreiro, a programação municipal inclui matinês com bandinhas, desfiles de blocos e shows. No restaurante Rancho, na praça central da cidade, o Carnaval das Antiga reedita os bailes de clubes, com banda de metais tocando marchinhas ao vivo e concurso de fantasias.

Percorrer o Vale do Paraíba de carro é a melhor opção pela proximidade entre as cidades. Veja, a seguir, um roteiro por algumas delas. Quem viaja perto do Carnaval deve consultar a ocupação de hotéis e pousadas, de alta procura na época.

SÃO LUIZ DO PARAITINGA (SP)

Armazém Três Léguas
A proprietária, Gilmara Seixas, garimpa produtos do Vale do Paraíba e da Serra da Mantiqueira, de queijos e embutidos artesanais a bolsas e livros de autores locais. O jogo americano de crochê sai por R$ 40.
R. Coronel Manoel Bento, 72, Centro, tel. (12) 98278-1026, Instagram @tresleguas

Lara C. Restaurante
A chef Lara Coninck ocupa uma simpática casinha no largo da igreja mais antiga da cidade, erguida no século 17, e se abastece de ingredientes locais. A shimejada com arroz orgânico sai por R$ 38.
Largo das Mercês, 21, Centro, tel. (11) 95473-9920, Instagram @larac.restaurante

Lano-Alto
A queijaria, que saiu do Mundial do Queijo 2022 com uma medalha Super Ouro pelo queijo Causo, abriu recentemente uma loja na fazenda. A fatia do produto premiado sai por R$ 42 (200 g).
Estrada do Fundinho, 1001, Catuçaba, distrito de São Luiz do Paraitinga, tel. (11) 94287-0204, Instagram @lano_alto

GUARATINGUETÁ (SP)

Laticínio Oro Bianco
Recebidos pelo proprietário, Simon Riess, que se formou queijeiro na Itália, os visitantes veem de perto as mansas búfalas da raça Murrah, testemunham a ordenha e compram burratas e muçarelas recém-produzidas. A degustação no jardim, a R$ 150 por pessoa, deve ser agendada.
Para chegar, é preciso pegar uma estrada rural secundária a partir da Rodovia Paulo Virgínio (SP-171), consultando mapa online. Tel. (12) 3125-3130, site orobianco.com.br

SILVEIRAS (SP)

Restaurante Trempe
Fundado pelo sociólogo Ocílio Ferraz, que dedicou a vida a divulgar a cultura tropeira, o antigo Restaurante do Ocílio mudou de mãos após sua morte, em 2016. O atual proprietário, Mateus Araújo, aprimorou cozinha e serviço sem abrir mão das tradições –mantém as mesas no jardim, o redário e a farofa de içá como estrela do menu (R$ 50, para três pessoas). Funciona de sexta a domingo, com pizzas de longa fermentação à noite.
R. José Ferraz Filho, s/nº, Vila Esperança, tel. (12) 98182-3161, Instagram @tremperestaurante

Casa Mugango
Na estrada rural que liga Silveiras a Cunha, o casal Virgílio Paiva e Fernando Marques cria ovelhas na Cabanha Bocaina, produz doce de leite e hospeda visitantes em um chalé à beira do lago, com capacidade para quatro pessoas. Diária a R$ 457 (ou R$ 500 por dia na semana do Carnaval). airbnb.com/h/casamugango

QUELUZ (SP)

Fazenda Santa Vitória
Os hóspedes das suítes e casas são entretidos com passeios a cavalo ou de bicicleta, cachoeira, banho de rio, piscina e spa, entre outros chamarizes. O sistema de pensão completa inclui eventos especiais, como almoço caipira no rancho da cachoeira e pizzas à noite. O hotel funciona apenas de quinta a domingo, exceto para grupos. Diária para casal a partir de R$ 2.200; pacote de cinco diárias para o Carnaval, de 17 a 22 de fevereiro, a partir de R$ 17 mil.
Rodovia João Batista Melo Souza, km 5, tel. (12) 99784-2568. fazendasantavitoria.com.br

Luzeiro Casa
Um sobrado de 1923, diante da antiga estação de trem, abriga o ateliê onde trabalham cinco artesãs da região. Com bordados, crochê, costura e outras técnicas, elas produzem bolsas, toalhas de mesa e aventais –o pano de copa bordado custa R$ 119. Visitas somente com agendamento
@luzeiro.casa

SÃO JOSÉ DO BARREIRO (SP)

Parque Nacional da Serra da Bocaina
Unidade de conservação da mata atlântica aberta à visitação, tem trilhas que foram usadas pelos comerciantes de ouro e de café, mirantes de onde se avista quase todo o Vale do Paraíba e várias cachoeiras que formam piscinas naturais.
Rod. Est. Francisca Mendes Ribeiro (SP-221), s/nº, km 0

Rancho Gastronomia e Cultura
O misto de restaurante e empório é uma embaixada informal da cultura caipira. No almoço, o bufê em fogão a lenha enfileira receitas típicas (R$ 65,90 o quilo de seg. a sex., R$ 89,90 o quilo nos fins de semana e feriados); à noite, o serviço é à la carte. Na loja anexa, encontram-se centenas de produtos da região, de goiabada a bules.
Praça Coronel Cunha Lara, 61, Centro, tel. (12) 3117-1317, Instagram @ranchosjbarreiro

RESENDE (RJ)

Alambique Reserva do Nosco
Na Fazenda Valparaíso, construída no século 19, Marcelo Nordskog produz a premiada cachaça Reserva do Nosco. Com agendamento prévio, os visitantes são recebidos pelo proprietário e degustam os rótulos na antiga senzala, onde ficam os barris de envelhecimento. A garrafa de cachaça branca sai por R$ 110.
Estrada da Fazenda Valparaíso, s/nº, Engenheiro Passos, distrito de Resende, tel. (24) 98803-8872; @reservadonosco

PASSA QUATRO (MG)

Queijaria Santo Antônio
Famosos entre chefs paulistanos, os queijos produzidos por Joãozinho Laura estão disponíveis na Venda dos Laura, dentro da fazenda. A fatia do Grana dos Laura (200 g) custa R$ 34. Com agendamento prévio, o visitante pode conhecer as caves de maturação.
Estrada da Fazenda Velha, s/nº, Pinheirinhos, tel. (35) 99835-8564

Casa do Monjolo
Inaugurado em agosto de 2022, o restaurante pertence ao chef Rafa Bocaina e ao queijeiro Joãozinho Laura. Da cozinha, saem pratos caipiras como o leitão à pururuca com feijão-tropeiro, arroz e salada, exclusivo dos sábados e domingos (R$ 157, para dois).
Estrada da Fazenda Velha, s/nº, Pinheirinhos, tel. (35) 99834-6678, Instagram @casadomonjolo

*A repórter viajou a convite da Fazenda Santa Vitória

Fonte: Folha de S.Paulo