Ilhas Malvinas oferecem imersão única na vida selvagem

Ao voltar da praia para sua colônia, um grupo de pinguins gentoo se depara com um elefante-marinho dormindo no caminho por onde costumam passar, à beira da lagoa. Dão meia-volta e decidem atravessar a lagoa, mas o elefante-marinho, como se estivesse brincando, entra na água e atravessa a nova rota.

O grupo, agora já acrescido de outros pinguins que vinham atrás, anda de um lado para o outro, sem saber por onde ir. Tentam uma saída pelo lado oposto ao caminho original, mas são impedidos pela vegetação, depois voltam a analisar a rota por terra próxima ao elefante-marinho e finalmente decidem atravessar a lagoa apressadamente.

A cena é acompanhada pela reportagem da Folha e por um casal de turistas suíços, que se diverte com a experiência de participar de uma “assembleia” dos gentoo, espécie conhecida como a nadadora mais rápida entre as aves. Em volta da lagoa, e dentro da água, dezenas de elefantes-marinhos curtem o sol da tarde.

Eles estão em Sea Lion Island, um dos destinos turísticos das Ilhas Malvinas (chamadas de Falkland pelos britânicos), arquipélago a 660 quilômetros do sul da Argentina que sediou a última grande guerra do continente sul-americano, em 1982.

Caras e isoladas do ponto de vista logístico, as ilhas oferecem uma experiência única de imersão na vida selvagem.

“É a melhor viagem de vida selvagem que já fiz. A melhor área para ver leões-marinhos, orcas e outros animais”, diz o suíço Marcus Hochuli, 51. Em Sea Lions Island, as orcas costumam aparecer pela manhã na North Beach, rondando uma piscina natural usada pelos filhotes de elefantes-marinhos.

No fim da tarde, em South Beach, os gentoos “surfam” as ondas após se alimentar perto de um aglomerado de algas após a arrebentação.

A ilha era uma fazenda de ovelhas até 2009, quando se tornou um parque nacional. Além de gentoos e elefantes-marinhos, abriga também pinguins-de-Magalhães e pinguins-de-penacho-amarelo, também conhecidos como “rockhoppers” (saltadores-de-rocha), gaviões carcará e os leões-marinhos que lhe dão nome.

Sedia uma pousada com capacidade máxima para 22 hóspedes com condições para pagar 185 libras (cerca de R$ 1.180) pela diária com três refeições incluídas, além dos voos em pequenos bimotores operados pelo serviço aéreo oficial do arquipélago. O preço dos voos varia, mas o proprietário do local, Mickey Reeves, diz que saem, em média a 200 libras (R$ 1.280).

Não é o único destino no arquipélago em que se pode andar lado a lado com os animais. A cerca de duas horas de carro da capital Stanley, por exemplo, está Volunteers Point, uma fazenda de ovelhas que abriga colônias de pinguins-de-Magalhães e de pinguins-rei, sua atração principal.

O preço é negociado com operadores de turismo, mas pode sair por 200 libras para três pessoas em um veículo.

No local, é possível andar no meio dos pinguins-rei, espécie de grande porte, com manchas amarelas no peito e no pescoço, e de seus filhotes com plumagem marrom. As muitas ovelhas da fazenda convivem pacificamente com as aves, bem perto da colônia.

Outras colônias de gentoos e mamíferos marinhos podem ser visitadas de carro, como Cape Dolphin, a cerca de quatro horas da capital.

Na região, há uma hospedagem com capacidade para dez pessoas divididas em três quartos, com diárias de 35 libras (R$ 224) por adulto e 15 libras (R$ 96) para crianças de dois a 16 anos.

Embora o nome do local sugira, não há golfinhos no local, batizado em homenagem a uma embarcação que naufragou ali —como Volunteers Point e outros pontos do arquipélago.

Para conhecer as ilhas, porém, é preciso planejamento e paciência. As Malvinas recebem apenas um voo comercial por semana, que sai de Santiago e para em Punta Arenas, no Chile —e uma vez por mês com parada em Puerto Gallegos, na Argentina.

Saindo de Garulhos ou do Galeão, no Rio de Janeiro, por exemplo, são cerca de oito horas em aviões, sem contar os tempos de espera em aeroportos ou possíveis noites na capital chilena, dependendo da conexão.

Em 2019, a Latam iniciou uma ligação mensal entre Guarulhos e o arquipélago, mas a linha foi suspensa com o início da pandemia e nunca mais retomada. A companhia não revela o motivo, limitando-se a dizer que não há prazo para o retorno do voo, que parava uma vez por mês em Córdoba, na Argentina.

A dificuldade para reservar passeios ou encontrar informações prévias é outro obstáculo, segundo os poucos turistas brasileiros que estiveram no mesmo voo que a Folha. É difícil encontrar preços nos sites oficiais e as reservas para voos locais ou passeios de carro, em geral, precisam ser feitas por telefone ou e-mail.

Com apenas 3.600 habitantes e isoladas politicamente do continente, já que ainda são alvo de pleitos de soberania argentina, as ilhas têm acesso à internet via satélite, o que impõe mais obstáculos à comunicação. Turistas dependem de cartões que custam entre 5 libras (R$ 32) por uma hora de acesso ou 30 libras (R$ 192) por 24 horas de acesso.

Não há caixas 24 horas, mas a maior parte dos estabelecimentos trabalha com cartões de créditos, com exceção de alguns pubs, incluindo os famosos The Globe e Victory Bar, ambos na região da Philomel Street, no centro de Stanley, onde também está o Groovy’s, que costuma ter noites de karaokê.

Mas a noite na cidade termina cedo: os pubs têm que fechar às 23h30 e os restaurantes costumam encerrar o serviço às 22h. Para comer, vale visitar o Waterfront Kitchen Cafe e o recém-aberto UnWined, uma casa de vinhos com cardápio de petiscos, como a lula recheada com queijo e linguiça.

As ilhas também oferecem passeios por locais onde argentinos e britânicos lutaram em 1982. Na região de Goose Green, por exemplo, há memoriais em locais de batalhas importantes e o Cemitério Argentino, onde 237 soldados daquele país estão enterrados.

Em Stanley, o Historic Dockyard Museum conta a história da guerra, com a exibição de fotos, vídeos e artefatos, e do próprio arquipélago, sua fauna e seu papel na exploração da Antártida, com direito a vista a um refúgio usado na exploração daquele continente nos anos 1950 e reconstruído no museu.

A melhor época para visitar o arquipélago é o verão, quando as temperaturas estão mais amenas e dias de céu azul são menos raros. Mas, ainda assim, roupas térmicas e casacos pesados são altamente recomendáveis, já que os fortes ventos costumam derrubar a sensação térmica.

Para deixar o país, é necessário pagar uma taxa de 26 libras (R$ 165) no aeroporto, onde o visitante certamente verá rostos que conheceu durante a viagem —como só há um voo semanal, os serviços de check in, segurança e embarque são prestados por pessoas que trabalham em outros empregos, como hotéis, bares e até por um membro da Assembleia Legislativa local.

Fonte: Folha de S.Paulo

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