Por que a PM sempre ganha frango assado na padaria?

Todo sábado e todo domingo, a esquina do lado de casa enche de gente com um papelzinho de senha na mão, esperando a vez de pegar comida. Lá fica um açougue que, aos fins de semana, vende churrasco, farofa, vinagrete e similares.

Junto com as pessoas, vêm seus carros. São picapes, SUVs, sedãs de luxo e a viatura da Polícia Militar. Não falha: os PMs sempre aparecem.

Ficam vários minutos, às vezes um par de horas, o carro parado e aberto, observando a situação com cara de prisão de ventre. Enquanto isso, outros veículos bloqueiam a calçada e estacionam no ponto de ônibus da rua transversal.

Uma vez interpelei um policial e lhe disse que aqueles carros estavam em lugar proibido. Ele não falou nada, mas seu olhar odiento transmitiu uma mensagem bem clara: “Como eu queria te dar uns sopapos e te levar preso por desacato”.

Mas ele não podia. Não naquela situação. Eu sou branco e, apesar de molambento, estava claro que residia na região. Ele precisava de um desacato maior para me enfiar no camburão. Se eu insistisse em cobrar que fizessem seu trabalho, talvez lhe desse motivo. Não insisti. Não sou tão burro.

Enfim, os guardas vão embora com sacolas recheadas de carne. É assim quase toda semana.

Quem nunca presenciou cena semelhante? O carro de polícia para em frente a uma padaria. Os meganhas trocam umas palavras com alguém no balcão, pegam um frango assado e vão embora.

Eu não acredito que seja extorsão explícita.

Os comerciantes querem proteção especial e por isso dão agrados aos policiais. Estes, sabendo disso, fazem a ronda dos estabelecimentos e ficam à toa, como se não quisessem nada, às vezes bicando um cafezinho.

É assim que funciona a segurança pública nos bairros ricos das cidades brasileiras. O comércio oferece cortesias à polícia, que reforça a presença nessas áreas e tolera infrações de trânsito e outras. Nestes tempos, nenhum jovem branco vai preso por fumar maconha em Perdizes ou em Pinheiros.

A lei parece ser diferente nas favelas e periferias.

Como se viu nas chacinas do Guarujá e da Bahia, a polícia prossegue com a política de chegar atirando. As abordagens são feitas aos murros e pontapés.

As classes alta e média-alta silenciam. Muitos aplaudem. É para isso mesmo que eles dão frango assado para os gambés.

Fonte: Folha de S.Paulo

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