Iraque: perfil da nação árabe que reúne história e conflitos atuais

O Iraque, país árabe que ocupa uma área onde surgiram algumas das mais antigas civilizações, tem sido um campo de batalha para forças adversárias desde a invasão americana e a derrubada de Saddam Hussein, em 2003.

Os governos que comandaram o país desde então, liderados por xiitas, tiveram dificuldades em manter a ordem. Com isso, o Iraque teve apenas poucos períodos de redução dos altos níveis de violência sectária. Estima-se que centenas de milhares de iraquianos tenham morrido, considerando a guerra iniciada pelos Estados Unidos e pelo Reino Unido e os conflitos internos que se seguiram.

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Apesar das guerras e da instabilidade, o Iraque mantém-se como um país vibrante e central para o mundo árabe

A instabilidade e os conflitos minaram os esforços para a reconstrução da economia, destruída por décadas de guerras e sanções econômicas, embora o Iraque seja um dos países com as maiores reservas de petróleo do mundo. A região do Curdistão, no norte, desfruta de uma significativa autonomia desde a fase final do regime de Saddam Hussein.

As guerras também impediram que o Iraque, antiga Mesopotâmia, fosse visitado por estrangeiros com mais regularidade. O país reúne valiosos tesouros arqueológicos, como as ruínas da Babilônia. Sua capital, Bagdá, é também uma das maiores referências no Mundo Árabe, tanto na história com no folclore da região.

O Iraque é muito rico culturalmente, tendo sempre sido um dos principais centros da música árabe. Vários artistas iraquianos, entre eles Munir Bashir, um dos mais famosos virtuosos do alaúde, e a cantora e instrumentista Sahar Taha, ganharam fama internacional.

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Munir Bashir, um mestre do alaúde, foi uma das maiores estrelas da música iraquiana

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República do Iraque

Capital: Bagdá

  • População39 milhões

  • Área438.317 quilômetros quadrados

  • Principais línguasÁrabe, curdo

  • Principal religiãoIslã

  • Expectativa de vida68 anos (homem), 72 anos (mulher)

  • MoedaDinar iraquiano

Fonte: ONU, Banco Mundial

Presidente: Abdul Latif Rashid

Ao vencer as eleições presidenciais de outubro de 2022, Abdul Latif Rashid se tornou o nono presidente eleito do Iraque, tendo ocupado anteriormente o cargo de ministro das Águas no governo de Nouri al-Maliki.

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O presidente do Iraque, Latih Rashid

Rashid concorreu pelo Partido da União Curda (PUK), liderado por seu cunhado e ex-presidente iraquiano Jalal Talabani. Latif Rashid nasceu no curdistão iraquiano e se formou em engenharia na Inglaterra.

Ele sucedeu Barham Salih, eleito em 2018. No Iraque o cargo de presidente é basicamente cerimonial, sem poder sobre os assuntos de governo.

O veterano politico curdo Barham Salih foi eleito presidente em outubro de 2018, para servir o primeiro de no máximo dois mandatos de quatro anos.

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Barham Salih foi escolhido para o cargo de presidente em 2018, seguindo o acordo que dá a Presidência a um curdo

De acordo com um acordo informal entre os partidos políticos, definido após a queda de Saddam Hussein, a Presidência iraquiana é reservada para os curdos. Já o cargo de primeiro-ministro fica nas mãos de um político árabe xiita, e o posto de presidente do Parlamento é entregue a um árabe sunita.

Primeiro-ministro: Mohammed Shia’ Al Sudani

Mohammed Shia Al Sudani ocupa o cargo de primeiro-ministro do Iraque desde outubro de 2022, quando seu partido venceu as eleições parlamentares. Ele sucedeu como chefe de governo a Mustafa Al Khadhimi que ficou no cargo por pouco mais de dois anos.

Em abril de 2020, Al-Kadhimi foi o terceiro nome indicado pelo presidente Salih para o cargo, depois que as duas primeiras opções não conseguiram obter o apoio necessário no Parlamento para compor o governo. Ele foi confirmado como novo premiê em maio, após seis meses de difíceis negociações políticas iniciadas com a renúncia de Mahdi.

Como primeiro-ministro, Al-Kadhimi enfrentaria, além dos desafios anteriores, como o alto desemprego, a crescente pandemia de covid-19. Político independente, sem filiação partidária, ele comandou, de 2016 a 2020, o serviço de inteligência iraquiano, conhecido pela sigla INIS.

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As crises no Iraque levaram à fragmentação da mídia, com veículos associados a diferentes facções

Existem centenas de publicações e inúmeras estações de rádio e televisão no Iraque. As seguidas crises políticas e de segurança, porém, resultaram num mercado cada vez mais fragmentado.

A TV é o principal meio para o consumo de notícias, e muitos veículos possuem filiações políticas ou religiosas. A IMN (Iraqi Media Network) é uma empresa estatal que opera veículos de mídia como a TV Al-Iraqiya e a rádio República do Iraque. A região autônoma do Curdistão tem sua própria mídia estabelecida.

A Constituição iraquiana protege a liberdade de expressão, mas a entidade Repórteres Sem Fronteiras diz que profissionais de mídia correm o risco de serem assassinados por grupos armados. O grupo jihadista Estado Islâmico perseguiu sistematicamente empresas e profissionais de mídia desde o início de sua ofensiva no Iraque, segundo a Repórteres Sem Fronteiras.

A entidade diz que o EI visa “monopolizar a atividade de mídia no território que conquista. Ela não permite a livre circulação de notícia e informações, e apenas os mais corajosos jornalistas ousam transmitir ou compartilhar informações” em áreas em que o grupo atua.

Empresas de radiodifusão estrangeiras que transmitem para o público iraquiano incluem a BBC, a rádio Monte Carlo Doualiya, baseada em Paris, e a TV Al-Hurra, a rádio Sawa e a Radio Free Iraq, financiadas pelos EUA. Muitas estão disponíveis em retransmissões locais – o Serviço Mundial da BBC é retransmitido em Bagdá e em Basra.

Quase todas as residências no país possuem uma antena receptora de transmissão por satélite, e há dezenas de redes de TV por satélite focadas no Iraque. O desenvolvimento da internet no Iraque está aquém do de outros Estados árabes, mas avançou nos últimos anos. Em 2020, segundo as agências We Are Social e Hootsuite, havia 29,88 milhões de usuários de internet, cerca de 75% da população. As plataformas sociais mais populares são o Facebook e o aplicativo de mensagens WhatsApp.

RELAÇÕES COM O BRASIL

Brasil e Iraque têm um histórico positivo, de boas relações, apesar dos conflitos em que o país se envolveu nas últimas décadas. Segundo o Itamaraty, o país é “parceiro tradicional do Brasil no Oriente Médio”. As relações diplomáticas foram oficialmente estabelecidas em 1967, mas os contatos bilaterais começaram em 1935, incluindo um acordo comercial assinado em 1939.

Novos acordos vieram, incluindo um de cooperação comercial, em 1971, substituído em 1977 por um de “cooperação econômica e tecnológica”. O setor privado brasileiro também envolveu-se com o país árabe, como na participação da empreiteira Mendes Júnior na construção de rodovias e a venda para o Iraque de veículos brasileiros modelo Passat pela Volkswagen.

A Guerra do Golfo, de 1991, levou à saída dos brasileiros do país e ao esfriamento das relações, e em 2003, o Brasil foi contrário à invasão do Iraque pela coalizão liderada pelos Estados Unidos. A guerra levou à morte do diplomata brasileiro Sérgio Vieira de Mello, durante ataque à sede da ONU em Bagdá, em agosto de 2003. Em 2012, a embaixada brasileira em Bagdá voltou a funcionar, após 21 anos.

LINHA DO TEMPO

Importantes datas na história do Iraque:

Antiguidade – A região da Mesopotâmia dá origem às primeiras civilizações, como os sumérios, os assírios e os babilônios.

Século 7 – A expansão muçulmana, iniciada por Maomé, chega à Mesopotâmia.

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As ruínas da Babilônia, no Iraque, foram parcialmente restauradas pelo governo nos anos 1980

762 – Bagdá é fundada, como capital da dinastia abássida dos califas.

1534-1918 – Região é parte do Império Otomano.

1917 – O Reino Unido toma Bagdá durante a Primeira Guerra Mundial.

1920 – A Liga das Nações aprova o mandato britânico sobre o Iraque, provocando uma ampla revolta da população local.

1921 – Os britânicos apontam Feisal, filho de Hussein Bin Ali, o xerife de Meca, como rei.

1932 – Fim do mandato britânico no Iraque, que se torna independente. O Reino Unido mantém bases militares no país.

1941 – O Reino Unido reocupa o Iraque depois de um golpe local em favor das potências do Eixo, durante a Segunda Guerra Mundial.

1958 – A monarquia é derrubada num golpe militar de esquerda liderado por Abd-al-Karim Qasim. O Iraque abandona o Pacto de Bagdá, um pacto militar regional favorável ao Reino Unido.

1963 – O primeiro-ministro Qasim é derrubado num golpe liderado pelo Partido Baath, ligado ao movimento pan-arabismo. O governo baathista é derrubado, mas tomaria o poder novamente cinco anos depois.

1968 – Golpe liderado pelos baathistas coloca Ahmad Hasan al-Bakr no poder.

1972 – O Iraque nacionaliza a Iraq Petroleum Company, empresa antes controlada por grandes petroleiras estrangeiras.

1979 – Saddam Hussein assume o poder como sucessor do presidente Al-Bakr. O novo líder realiza um expurgo de dezenas de membros do partido Baath, acusados por ele de traição. Os acusados são julgados, e vários são executados.

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Após tomar o poder em 1979, Saddam Hussein perseguiu e matou adversários e reprimiu minorias

1980 – Iraque e Irã iniciam uma guerra, inicialmente por uma disputa territorial, que duraria oito anos – e deixaria cerca de 2 milhões de mortos, dos dois lados. No conflito, o regime iraquiano recebe apoio dos países árabes sunitas e de potências ocidentais.

1981 – Um bombardeio aéreo israelense destrói o reator nuclear iraquiano de Osirak, próximo a Bagdá.

1988 – O regime iraquiano ataca a cidade curda de Halabjah com gás venenoso, matando milhares de pessoas.

1990 – Em meio a uma disputa regional sobre os preços do petróleo, o Iraque invade e anexa o Kuwait, levando ao que ficou conhecida como Guerra do Golfo. Uma enorme operação militar liderada pelos Estados Unidos força a retirada do Iraque do Kuwait em fevereiro de 1991.

1991 – Março e Abril – Encorajadas pela derrota do Iraque na Guerra do Golfo, as populações iraquianas de xiitas, no sul, e de curdos, no norte, rebelam-se, provocando uma repressão brutal do regime de Saddam Hussein. A ONU aprova o estabelecimento de uma área segura no norte do país para proteger os curdo e determina que Bagdá encerre suas atividades militares na área. O Iraque passa a ser sujeito a um programa de inspeção de armamentos.

1992 – Uma zona de exclusão aérea, por onde aviões iraquianos não podem passar, é estabelecida no sul do Iraque.

1995 – A ONU permite a retomada parcial das exportações iraquianas de petróleo para a compra de alimentos e medicamentos para sua população, no programa conhecido como “petróleo por comida”.

1998 – Em outubro, o Iraque suspende sua colaboração com a comissão especial da ONU para destruição de suas armas de destruição em massa. Dois meses depois, EUA e Reino Unido bombardeiam alvos no Iraque, com o fim de destruir seus programas de armas nucleares, químicas e biológicas.

2002 – Em setembro, o presidente George W. Bush diz à ONU que o Iraque representa um “perigo grave e crescente”. Dois meses depois, os inspetores da ONU retornam ao Iraque com o apoio de uma resolução do Conselho de Segurança da ONU, de número 1441, que ameaça com “graves consequências” se o Iraque desrespeitar de forma “material” os termos da resolução.

2003 – Invasão liderada pelos EUA derruba o regime de Saddam Hussein e leva a um violento conflito interno, com diferentes grupos disputando o poder e combatendo a ocupação estrangeira.

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Invasão de 2003 levou à rápida queda de Saddam Hussein, mas uma insurgência nasceu em seguida

2003 – Dezembro – Saddam Hussein é capturado na cidade de Tikrit.

2004 – Surgem evidências fotográficas de abusos de prisioneiros iraquianos por parte de soldados americanos na prisão de Abu Ghreib, em Bagdá. Em junho, os EUA entregam a soberania nacional ao governo interino liderado pelo primeiro-ministro Iyad Allawi.

2005 – Outubro – Eleitores aprovam uma nova Constituição, que visa criar uma democracia federal islâmica. Em dezembro, iraquianos elegem pela primeira vez o primeiro governo e o Parlamento desde a invasão liderada pelos EUA.

2006 – Fevereiro – Um atentado a bomba num importante santuário xiita na cidade de Samarra dá início a uma onda de violência sectária, em que centenas são mortos, Em junho, o líder da Al-Qaeda no Iraque, Abu Musab al-Zarqawi, é morto num ataque aéreo realizado pelos EUA.

2006 – Dezembro – Após ter sido condenado e sentenciado à morte, Saddam Hussein é executado por crimes contra a humanidade.

2007 – O Reino Unido devolve o controle sobre a segurança na província de Basra às forças iraquianas, o que na prática encerra os quase cinco anos de controle britânico no sul do Iraque.

2009 – Tropas americanas retiram-se de cidades iraquianas, seis anos após a invasão, tendo formalmente entregado as obrigações sobre a segurança às novas forças iraquianas.

2010 – Agosto – Sete anos após a invasão liderada pelos EUA, a última brigada de combate americana deixa o Iraque.

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A tomada de Mosul pelo grupo Estado Islâmico levou a uma nova onda interna de refugiados

2014 – Junho a setembro – Rebeldes sunitas liderados pelo grupo Estado Islâmico do Iraque e do Levante atacam a partir da província de Anbar e tomam Mosul, a segunda maior cidade do Iraque, além de outras cidades menores. Dezenas de milhares de pessoas fogem em meio a atrocidades cometidas pelo grupo. Forças curdas, os EUA e o Irã ajudam o governo iraquiano a responder aos ataques.

2014 – Dezembro – O governo iraquiano e a liderança da região curda assinam um acordo de compartilhamento da riqueza do petróleo e recursos militares. A esperança era de que o acordo unisse o país diante da ameaça representada pelo chamado Estado Islâmico (EI).

2015 – Março – O EI destrói relíquias assírias nos sítios arqueológicos de Nimrud e Hatra.

2017 – Novembro – Forças governamentais, com aliados xiitas e curdos, expulsam o EI de praticamente todas as suas bases.

2019 – Setembro-novembro – Pelo menos 400 pessoas morrem em protestos contra a corrupção e o desemprego em cidades iraquianas, incluindo Bagdá, levando à renúncia do então primeiro-ministro, Adel Abdul Mahdi.

2022 – Em outubro, Mohammed Shia Al Sudani foi eleito primeiro-ministro após seu partido ter vencido as eleições parlamentares. Ele sucedeu como chefe de governo a Mustafa Al Khadhimi que ficou no cargo por pouco mais de dois anos.

Fonte: BBC