Oportunidade: Canadá continua buscando profissionais estrangeiros com qualificação

De janeiro a julho deste ano, a Receita Federal recebeu 21.873 declarações de brasileiros saindo definitivamente do Brasil. Ficou próximo ao total de comunicados de todo 2018, que foi de 23.149. Tudo indica que a saída de brasileiros neste ano será recorde.

O último grande salto fora registrado em 2016, no ápice da recessão: 21.040, com alta de 41% nesses documentos. É onda natural em momentos de turbulência econômica, quando as pessoas tendem a buscar outros países para viver em busca de melhores oportunidades de trabalho, segurança e qualidade de vida.

Países oferecem oportunidades para o brasileiro no exterior, sobretudo aqueles que precisam suprir a carência de mão de obra e impulsionar o crescimento populacional, como é o caso do Canadá. O destino da América do Norte concedeu 3.950 vistos permanentes a brasileiros em 2018, aumento de 88% sobre o ano anterior, de acordo com o Consulado Geral do Canadá no Brasil. Em cinco anos, o avanço bate 128%. Os vistos de até seis meses para viajantes brasileiros cresceram 74% entre 2015 e 2018, para 197 mil. Pelos dados do Itamaraty, em 2018 já havia ao todo perto de 110 mil brasileiros vivendo no Canadá, 2,7 vezes mais que em 2013, antes do início da crise no Brasil.

Os caminhos existem e são atraentes para quem fincar os pés no país. Especialistas alertam, contudo, que a mudança não é fácil. Há uma diferença entre a expectativa e a realidade, sendo preciso enfrentar desafios em diversas frentes. Celina Hui, presidente executiva da Immi Canadá, consultoria especializada em imigração para o país, destaca que é preciso ter os pés no chão para mudar de país:

— Há pessoas que vêm como uma expectativa fora da realidade. Uma vez aqui, essas pessoas levam um tombo. Imigrar exige um planejamento enorme. Mesmo com o visto permanente, a pessoa tem de montar uma nova vida, procurar emprego, estudar, avançar aos poucos, se adaptar a uma nova cultura, ao clima — conta ela, que fica em Vancouver. No Canadá é preciso montar uma rede de contatos e referências profissionais, o que já traz um desafio. A consultora destaca ainda uma mudança recente no perfil dos brasileiros chegando ao país: — De um ano e meio para cá, tem maior movimento de jovens solteiros ou casais, que planejam ter filhos no Canadá. É mudança que pode ter a ver com a crise no Brasil. Antes, houve três ondas: das pessoas que vinham fazer faculdade e voltavam para o Brasil; das que vinham estudar para já ficar no país e, na sequência, a das famílias.

“Imigrar exige planejamento. Mesmo com o visto permanente, a pessoa tem de montar uma nova vida, procurar emprego, estudar, avançar aos poucos, se adaptar a uma nova cultura” Com um programa formal de incentivo à imigração — em busca de pessoas jovens e qualificadas para viver no país, cuja população soma perto de 37 milhões de pessoas, menos que em todo o estado de São Paulo — o Canadá recebe mais de 300 mil imigrantes por ano.

Quem deseja imigrar, aconselha João Marques, da Emdoc, que presta consultoria jurídica de imigração, deve se preparar. Ou seja, se informar sobre a vida no destino, o idioma, a cultura, as exigências de visto, os sistemas de educação e saúde, planejar o sustento. Há uma profusão de sites, blogs e consultorias especializadas. Sem contar os canais oficiais, incluindo eventos sobre estudo e trabalho no país.

Marques recomenda uma experiência temporária, antes de mudar. Foi o que fizeram a farmacêutica Juliana Bezerra, de 39 anos, e o marido Vitor Silva, de 37 anos, analista de sistemas, que trocaram o Rio por Toronto em outubro passado, levando com eles a filha Joana, hoje com 6 anos. A decisão de deixar o Brasil foi tomada em 2015, quando começaram a usar as férias para conhecer Auckland, na Nova Zelândia, depois, Toronto e Vancouver, o que acabou levando à decisão pelo Canadá. — É um projeto que exige muito planejamento e uma reserva financeira para custear despesas gerais e com especialização profissional. Mas enxergamos como um investimento até que estejamos bem colocados no mercado de trabalho — diz a farmacêutica.

Ela acaba de concluir um ano de especialização em administração, e se prepara para outro, em biotecnologia. — No Canadá, para pedir o Express Entry, o visto de residente permanente, é preciso ter uma pontuação alta em diversos itens avaliados pelo governo. Enquanto trabalhamos para melhorar ao máximo nossa pontuação, optamos pelo visto de estudos para mim, que depois permite trabalhar, porque avaliamos que há oportunidade de emprego para o meu marido, que é da área de TI. Ele já tem autorização para trabalhar e está buscando uma vaga — comenta Juliana.

O Express Entry é a entrada mais desejada por quem quer viver no Canadá, um visto que resulta do processo de seleção de imigrantes qualificados pelo governo federal. Vale para todos os territórios e províncias — com exceção de Québec, que tem programa próprio. O candidato pode fazer um teste on-line para saber se é elegível ou não. Escolaridade, proficiência em um ou nos dois idiomas do país (inglês e francês) e experiência de trabalho estão entre os fatores considerados.

A psicóloga Leticia Belia, de 47 anos, e o marido dela, o professor de filosofia Edmar Rodrigues, de 54 anos, chegaram a St. John, capital de Terra Nova e Labrador, no nordeste do Canadá, no último dia 16. Ter considerado províncias menos conhecidas na hora de planejar a mudança foi fundamental, conta ela: — Morávamos em Uberlândia, onde Edmar cursou mestrado e doutorado em filosofia e para onde eu mudei, deixando o Rio. Concluí minha terceira graduação, em psicologia, mas o mercado estava difícil. Ele tinha morado fora por nove anos. Então, em 2017, decidimos ir para o Canadá. Nos candidatamos a cursos em perto de 15 universidades. A Memorial, em Terra Nova, chamou o Edmar para uma especialização em filosofia, e com bolsa de estudos.

A bolsa reduz o investimento do casal, que se instalou numa residência estudantil dentro do campus, com aluguel mais acessível. As aulas começam em setembro, e Leticia já busca um curso para aprimorar o inglês e um emprego.

Emprego é decisivo

Uma família com dois adultos e uma criança em idade escolar, explica Celina, da Immi, precisa, em média, de 3.600 a 4.500 dólares canadenses por mês (1 dólar canadense equivale a R$ 3,09). Dá um mínimo de R$ 150 mil para o primeiro ano, contando só o básico (aluguel, luz, internet, transporte). Maura Beltrão, presidente da Belta, que reúne as instituições de programas de intercâmbio no exterior, diz que o Canadá lidera a preferência dos brasileiros para estudar fora do país: — Cresceu a procura de famílias por programas de pós-graduação que ofereçam a opção de ficar um período longo. São casais jovens e com filhos em idade escolar atrás de qualidade de vida.

Ainda que a estada não se torne definitiva, diz ela, a pessoa sai ganhando: — Tem o lado de ter muita gente qualificada saindo do Brasil, mas muitos com perspectiva de voltar. E fazem diferença porque trazem inovação e aprendizado a suas áreas de atuação. Voltando ou ficando por lá, criam uma ponte entre a academia ou entre empresas dos dois países.

A cartada de ouro, porém, é mesmo um contrato de trabalho. Henrique Trebilcock, engenheiro de automação paulista de 28 anos, trabalha desde o início do ano na Frontmatec, empresa em Québec, na província de língua francesa. — Buscava uma oportunidade que combinasse estudo e trabalho. Mas encontrei uma vaga com o meu perfil no banco de oportunidades do Québec International. Eu me candidatei em março de 2018, passei por entrevistas e, no início de junho, tive a confirmação da vaga — conta ele, que precisou estudar cinco horas de francês por semana para chegar ao país apto a se comunicar no idioma local. Em dezembro, Trebilcock mudou para Québec com a mulher, Camila de Oliveira, de 27 anos, e o filho. Ele tem um visto de trabalho de dois anos. Mas, após o primeiro ano de remuneração comprovada na empresa, pode pedir o visto permanente, explicou.

Em Québec, a taxa de natalidade encolhe; elevando a demanda por mão de obra. A previsão é que, em dez anos, serão mais de 1,3 milhão de vagas de trabalho a preencher, com 20% delas ocupadas por imigrantes. As grandes cidades da província, Québec e Montreal, têm escritórios de recrutamento no exterior.

Visto permanente

O Express Entry, o processo de seleção de imigrantes qualificados do governo canadense, vale para todo o país, com exceção da Província de Quebec. É preciso preencher um formulário detalhado de avaliação, com informações sobre qualificação e experiência profissional do candidato e do cônjuge, se houver, comprovação de proficiência em um ou nos dois idiomas do país. Quem atinge alta pontuação entra no banco de candidatos internacional. Uma vez no grupo, os mais bem avaliados, e principalmente os com oferta de emprego, podem receber um convite para aplicar para o visto permanente. A maior parte das províncias têm programas de indicação ao Express Entry.

Outros vistos

O visto de estudos é fornecido a quem vai fazer um curso de mais de seis meses, que permite levar a família. A pessoa recebe uma permissão de trabalho proporcional ao tempo de curso e de no máximo três anos, conforme a modalidade frequentada (técnico, graduação ou pós-graduação). O cônjuge também pode obter uma permissão para trabalhar. A EduCanada fará oito eventos no Brasil este ano sobre oportunidades de estudos. No Rio, serão dias 3 e 4/10. É possível se inscrever para um visto de trabalho, vinculado a uma oferta de emprego.
Saúde e educação públicas

Cada província ou território tem sua regra. Em geral, estudantes internacionais devem pagar matrícula e mensalidades em instituições de ensino no Canadá . Algumas, porém, dispensam de pagamento filhos dependentes de pessoas com vistos temporários de estudo ou trabalho. As regras para saúde também cabem às províncias. Ao chegar, o ideal é ter um plano de saúde privado. Depois, poderá ou não ser incluído no sistema público, dependendo da instituição de ensino que frequenta ou o contrato de trabalho.

Quebec

É preciso consultar regularmente o sistema do governo, que pode alterar as regras de seleção de imigrantes a qualquer momento. Também há vistos temporários para estudos e trabalho. Este último permite pedir o visto de residência permanente. Interessados em imigrar para Quebec devem se inscrever pelo portal Arrima, do Ministério da Imigração da província. Os escritórios do Québec International e do Montreal International atuam em recrutamento profissional, com bancos de ofertas de empregos nessas cidades, realizando eventos no Brasil. // Fonte: Jornal O Globo.

Fonte: Brazilian Press