Em 1981, o historiador americano Allan Lichtman conheceu um especialista russo em terremotos no Instituto de Tecnologia da Califórnia, nos Estados Unidos, que lhe fez uma proposta inesperada.
Vladimir Keilis-Borok havia dedicado sua carreira na hoje extinta União Soviética (URSS) ao desenvolvimento de um método que permitisse antecipar quando um terremoto ocorreria e queria testar sua validade também para prever com sucesso o resultado de eleições.
“Na URSS não havia eleições e como eu era um especialista em história da presidência dos Estados Unidos, ele sugeriu que trabalhássemos juntos”, lembra Lichtman em conversa com a BBC News Mundo, o serviço de notícias em espanhol da BBC.
Juntos, eles desenvolveriam um modelo de previsão dos resultados eleitorais que adivinhava quem seria o vencedor das eleições presidenciais nos Estados Unidos desde a reeleição de Ronald Reagan em 1984.
O historiador e o sismólogo tornaram-se um “casal estranho” de pesquisadores e começaram a buscar uma maneira de aplicar à história da corrida pela Casa Branca as técnicas de reconhecimento de padrões que Keilis-Borok vinha desenvolvendo no campo da geofísica no Instituto de Previsão de Terremotos de Moscou.
Eles começaram a analisar retrospectivamente os resultados das eleições presidenciais de 1860.
“O segredo do nosso modelo foi reconceituar as escolhas em termos geofísicos, estabelecendo dois cenários possíveis”, explica Lichtman.
“A primeira nós identificamos como uma situação de estabilidade, em que o partido na Casa Branca permanece; na segunda, ocorre um terremoto e o partido no poder o perde”, acrescenta.
Seguindo o raciocínio algorítmico com o qual Keilis-Borok estava familiarizado e o conhecimento da história dos Estados Unidos de Lichtman, eles identificaram uma série de fatores determinantes no resultado da corrida presidencial.
Eles reduziram seus 30 “fatores” iniciais para 13, todas em busca de um padrão que permitisse uma previsão confiável.
E acabaram colocando 13 condições, uma para cada fator.
Quando 6 ou mais delas não ocorrem, nas palavras de Lichtman, “temos um terremoto político”. Em outras palavras, o partido no poder perde a Casa Branca.
Após sua pesquisa, Lichtman concluiu que o que determina o resultado eleitoral é o “pragmatismo” dos eleitores nos Estados Unidos.
“A decisão, no final das contas, é sobre como o país foi governado, não sobre a campanha. A questão é se o partido no poder merece mais 4 anos.”
Seu método se provou tão preciso que o jornal americano New York Times não hesitou em chamar Lichtman de “o Nostradamus da eleição presidencial”.
Lichtman e Keilis-Borok previram a reeleição de Reagan antes mesmo de se saber quem seria seu rival democrata.
E em 2016, já sem o amigo russo, morto em 2013, foi um dos poucos que previu o triunfo de Donald Trump.
Somente na eleição apertada de 2000, quando o candidato republicano George W. Bush venceu por pouco o democrata Al Gore, o modelo não funcionou.
Gore obteve mais votos do que Bush, mas o sistema eleitoral dos EUA acabou dando a Bush a presidência.
O fato de o voto popular e o Colégio Eleitoral não estarem alinhados “não acontecia desde 1888”, disse Lichtman, que desde então previu quem será o presidente. Em 2016, Trump também foi o vencedor, apesar de não ser o candidato mais votado.
Na ocasião, Hillary Clinton obteve cerca de 3 milhões de votos a mais do que Trump, mas perdeu no Colégio Eleitoral.
Mas o que o modelo dos 13 fatores diz sobre a disputa de Donald Trump e do candidato democrata Joe Biden pela Casa Branca?
1. O partido na Casa Branca ganhou assentos nas eleições de meio de mandato
Falso. Os republicanos perderam em 2018 as eleições legislativas que sempre acontecem no meio do mandato do presidente.
Ponto para Biden.
Trump 0 – Biden 1
2. Nenhum rival desafia o presidente nas primárias do partido no poder
Verdade. Nenhum candidato alternativo a Trump concorreu nas primárias republicanas.
Ponto para Trump.
Trunfo 1 – Biden 1
3. O presidente busca a reeleição
Verdade. Trump busca reeleger-se neste ano, após vitória nas eleições de 2016.
Ponto para Trump.
Trump 2 – Biden 1
4. Não há candidatos de um terceiro partido
Verdade. Embora o rapper Kanye West tenha vindo a público anunciar sua candidatura, ele só aparecerá nas urnas em um pequeno número de estados.
Ponto para Trump.
Trump 3 – Biden 1
5. A economia está em boa forma
Falso. A pandemia do coronavírus empurrou os Estados Unidos para uma recessão.
Ponto para Biden.
Trump 3 – Biden 2
6. A economia cresceu no mandato presidencial tanto quanto nos dois anteriores
Falso. Apesar de o Produto Interno Bruto (PIB, soma das riquezas de um país) dos Estados Unidos ter crescido continuamente durante o mandato de Trump, a pandemia mudou tudo em poucos meses.
Ponto para Biden.
Trump 3 – Biden 3
7. O presidente fez grandes mudanças na política nacional
Verdade. A administração Trump introduziu mudanças significativas, como a reforma tributária, e usou ordens executivas que o presidente pode aprovar para reverter muitas políticas da era Obama.
Ponto para Trump.
Trump 4 – Biden 3
8. Não houve conflitos sociais durante o mandato
Falso. Após a morte de George Floyd, um homem negro, por um policial branco em Minneapolis, uma onda de protestos estourou no país e houve graves episódios de violência.
Ponto para Biden.
Trump 4 – Biden 4
9. Não houve escândalos na Casa Branca
Falso. Trump foi alvo de um processo de “impeachment”, um julgamento político no Congresso e tem sido o protagonista de muitos outros escândalos, desde o suposto complô russo para influenciar as eleições de 2016 até as acusações de nepotismo na Casa Branca.
Ponto para Biden.
Trump 4 – Biden 5
10. Os militares dos Estados Unidos não sofreram grandes fracassos no exterior
Verdade. O professor Lichtman não detecta grandes reveses para as forças americanas no exterior durante a presidência de Trump.
Ponto para Trump.
Trump 5 – Biden 5
11. A Casa Branca alcançou grande sucesso militar no exterior
Falso. Lichtman acredita que Trump não sofreu grandes fracassos, mas também não obteve vitórias relevantes.
Ponto para Biden.
Trump 5 – Biden 6
12. O candidato do partido no poder tem carisma
Falso. Lichtman considera Trump “um grande showman”, mas sua figura só atrai simpatia de sua base de eleitores mais leais.
Ponto para Biden.
Trump 5 – Biden 7
13. O candidato que desafia o presidente não tem carisma
Verdade. Ao contrário de Obama, do qual foi vice-presidente, Biden não se destaca
Ponto para Trump.
Sendo assim, a pontuação é a seguinte:
Trump 6 x Biden 7
O modelo dos 13 fatores vaticina que o próximo presidente dos Estados Unidos será Joseph Biden.
Mas o método funcionará em 2020?
Lichtman alerta que existem fatores externos que podem influenciar a eleição, como a interferência russa.
Ele também teme que os democratas, com os quais diz estar ideologicamente alinhado, possam perder votos em meio às tentativas de Trump de desacreditar o voto pelos Correios ou mesmo que seus partidários intimidem os de Biden.
Mas ele ainda acredita no modelo que concebeu com Keilis-Borok e, apesar de os Estados Unidos e o mundo terem mudado muito desde 1860, ele ainda está determinado a aplicá-lo.
“Não é fácil fazer uma previsão pública a cada quatro anos e dizer quem vai ser o próximo presidente. Às vezes, sinto um arrepio quando penso no que acontecerá comigo se eu estiver errado, mas esses fatores ainda são válidos porque estão baseados na percepção correta, de que o eleitor decide sobre a gestão do governo, não sobre a campanha”.
Cabe agora esperar pelas eleições, marcadas para o dia 3 de novembro, para saber se a previsão de Lichtman de novo estará correta.
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Fonte: BBC