king Nomeando e batizandoEstá lá, no registro de nascimento:

Pedro de Alcântara Francisco Antônio João Carlos Xavier de Paula Miguel Rafael Joaquim José Gonzaga Pascoal Cipriano Serafim de Bragança e Bourbon.

Ele foi Pedro I, o primeiro imperador do Brasil.

A Princesa Isabel, neta de Dom Pedro II, não fugiu muito à regra, como se constata em sua certidão:

Isabel Cristina Leopoldina Augusta Michaela Gabriela Raphaela Gonzaga de Orléans e Bragança.

Era muito comum receber sobrenomes de pais, avós e bisavós. Com o passar dos tempos, encolheram-se os nomes, mas foi aparecendo outras esquisitices. Vejam, por exemplo, o meu caso:

Lá em casa fomos todos Carlos.

Meu saudoso pai cismou de homenagear um bom samaritano que lhe deu acolhida quando se mudou da roça para Governador Valadares e nos registrou e batizou assim.

Digo fomos, porque Carlos Antônio, o primogênito, sucumbiu a uma meningite quando tinha três anos e eu, Carlos Roberto, um.

Seis anos depois, quando nasceu o caçula, papai homenageou o filho morto, invertendo a ordem dos substantivos. Foi assim que nasceu Antônio Carlos.

É estranho constatar que somos Carlos, mas jamais fomos Carlos.

Um cresceu Toninho e o outro, Beto.

Quando, em alguma repartição pública, alguém me chama pelo primeiro nome sinto estranheza. É como se estivessem chamando outra pessoa. Eu não me sinto Carlos.

Os brasileiros possuem essa mania de inovar com os nomes dos filhos, alguns fazendo combinações com os nomes do casal. Às vezes dá certo.

Lá em São Raimundo, por exemplo, Luiz e Ana Santos deram ao mundo a bela Analu; José e Ana são pais da talentosa poeta Josiana Camargos; Seu André e dona Lina Pereira são pais de Andrelina, que há mais de duas décadas assina cartão de ponto na receita federal; Eliseu e Ângela Marques deram ao mundo a espevitada Elisângela, moça namoradeira que ficou sem casar; Seu Hermes e dona Gilda Oliveira fecundaram a Hermenegilda, outra amiga de infância. Hermê preferia ser chamada pelo apelido.

Não sei o porquê, mas a combinação é mais utilizada quando nascem as filhas. Tento me lembrar de um único garoto que seja a combinação dos nomes paternos e não consigo encontrar.

Eu tive um tio comunista que abrasileirou os nomes de ícones soviéticos em alguns dos seus 20 filhos. Lenov e Eziev evocavam Lenin e Brezhnev, enquanto a doce Krutchenka era uma homenagem a Nikita Khrushchev.

Cada um é cada um.

As telenovelas e a cena musical também influenciam bastante. No início dos anos 1970 abundaram os Robertos Carlos. Na seleção brasileira que disputa a copa da Rússia tem um lateral chamado Fagner.

Homenagear craques dos times de coração é um fenômeno mais masculino e houve um tempo em que nasceram tantos Edsons, que daria para montar centenas de times só com Pelés.

Sem falar nos Breitners, Rumenigges, Mayers e Beckenbauers, todos nascidos do amor paterno ao esporte bretão.

O Brasil de agora vive uma fase de Maicons, corruptela de Michael, certamente. Que tanto pode ser o falecido Jackson quanto o Douglas, ator de Hollywood.

Tem Maicon no Grêmio e no Corinthians. Os dois são bons jogadores, mas existem outros menos talentosos.

Há também as fases em que alguns nomes se tornam extremamente populares, com gerações inteiras de Gabrieís e Luízas, Diegos e Isabelas, Diogos e Luanas, o que causa tremenda confusão na hora da chamada escolar.

Vivemos agora a era dos Benícios, Cauãs, Danielas, Valentinas, Ian e Yan, Rafaelas e Raphaelas, Sophias e Sofias.

Mas é preciso dizer que alguns nomes vão desaparecendo com o tempo, caindo em desuso.

José e Maria escassearam, mas ainda estão em relativa voga. Tanto um quanto o outro costuma vir seguido de um santo ou santa de devoção de quem os gerou: Maria Aparecida, José Antônio e por aí adentro.

Não seria uma aberração especular que nunca mais nasceu uma Benvinda, uma Alzira, Anastácia, Castorina, Cidália, Dorotéia. Efigênia, Josefina ou Lucrécia.

Ou um Abelardo, Adamastor, Alcides, Amâncio, Ambrósio, Anacleto, Asdrúbal, Domingos, Durval, Euclides, Evaristo, Ezequiel, Gaudêncio, Isidoro, Justino, Juvenal, Ladislau,  Raimundo, Venâncio, Zacarias ou Venceslau, embora seja provável que ainda nasça algum Severino. no nordeste do país.

Eu sinto falta dos Joaquins e Manoéis que povoaram a minha infância, mas gostaria mesmo de saber é o que foi feito dos inseparáveis Benjamin e Juvenal, que pegaram carona em um caminhão Scania em direção a São Paulo e deles nunca mais ouvi.

Fonte: Brazilian Voice