veio Pescoço de PeruAs redes sociais foram inun­dadas por fotos de ‘velhinhos e velhinhas’ nos últimos dias. Um aplicativo que ‘envelhece’ as pessoas virou moda entre anônimos e famosos, que se diver­tiram com as supos­tas imagens futuristas.
A minha versão não foi das mais generosas.
Recusei-me a postá-la, mas o compositor Dalmir Lott fez questão de tornar público aquilo que eu gostaria de manter privado.
Fiquei com a cara daquele quibe de lanchonete de rodoviária que ninguém quis comprar, lá pelas duas da manhã.
Orelhas de abano, nariz de borracha porosa, cabelos escassos, o rosto com a aparência do mapa rodoviário da Califórnia, pés de galinha espalhados por toda a face, é o que se vê.
As pelancas do pescoço, uma vez espichadas, fariam duas vezes o trajeto Rio-São Paulo.
Minha cara ficou parecida com o cotovelo do Keith Richards, do Rolling Stones.
Eu, que já não sou nenhum Richard Gere, fui ‘monstrificado’.
No entanto, se o aplicativo da internet é cruel, a vida é mais. Uma existência não se consuma (e consome) em meia dúzia de cliques e risadas.
Sei que ficarei com um aspecto ainda pior, caso consiga superar décadas de abusos e descaso com o presente dado por meus genitores.
Maracujás enrugados dão mais suco, diria meu falecido pai.
Não é bem assim.
Problemas de todas as espécies branqueiam os cabelos, riscam sulcos com o estilete dos dias, dando a mim um aspecto estranho, desenhando uma caricatura do que fui um dia.
Boletos, ex-‘conjes’ (como discursaria o Moro), filhos, políticos filhos da puta, times de futebol e suas defesas pífias, uísques de procedência duvidosa, drogas legais e ilegais, religião, turbulências de avião, filas em repartições públicas, cida­dãos corruptos e corrompidos no meu entorno, buracos nas estradas, medo da violência urbana, insônia, ignorância e fúria dos extremistas, trânsito caótico, as falas da Damares, a ganância dos poderosos e a ausência de Deus em tantos momentos farão de mim algo muito pior do que essa calopsita com pescoço de peru, que o Dalmir Lott espalhou pelas redes sociais.gais e ilegais, religião, turbulências de avião, filas em repartições públicas, cida­dãos corruptos e corrompidos no meu entorno, buracos nas estradas, medo da violência urbana, insônia, ignorância e fúria dos extremistas, trânsito caótico, as falas da Damares, a ganância dos poderosos e a ausência de Deus em tantos momentos farão de mim algo muito pior do que essa calopsita com pescoço de peru, que o Dalmir Lott espalhou pelas redes sociais.

Fonte: Brazilian Voice