Tudo indica que o Alasca será o primeiro Estado americano a atingir a imunidade de rebanho e voltar à normalidade. A proporção dos residentes que receberam ao menos uma dose de vacina contra covid é de 30% – maior do que a média nacional nos EUA, de 23%. Mas a recente hesitação de parte da população local em se vacinar é o desafio que acende um alerta em todo o país.
Em 2020, os EUA compraram doses suficientes para imunizar toda a população. Em 2021, um esforço coordenado fez com que o ritmo de aplicação das doses fosse acelerado. Os americanos têm vacinado mais de 2,5 milhões de pessoas por dia. Mas obstáculos de logística e distribuição ainda persistem e é preciso superar o ceticismo de parte da população com os imunizantes, especialmente entre o eleitorado republicano.
Três em cada dez americanos dizem que não pretendem se vacinar, segundo pesquisa do Pew Research Center, de fevereiro, mais de dois meses depois do início da campanha de vacinação em massa no país. O número é menor do que o registrado em novembro, quando quatro entre dez davam a mesma resposta. Para atingir a imunidade de rebanho, especialistas estimam que entre 70% e 85% da população deva ser imunizada, o que será difícil de alcançar se 30% rejeitarem a vacinação. “O ceticismo em relação à vacina pode reduzir o número de pessoas que serão vacinadas quando as doses estiverem disponíveis para todos”, afirma Enrique Neblett Jr., professor de comportamento e educação de saúde da Universidade de Michigan.
O Alasca foi o primeiro Estado a abrir a vacinação para qualquer residente com mais de 16 anos, independentemente de condição de saúde ou profissão. Por trás da medida estava o fato de que muitas farmácias e clínicas não conseguiam preencher todos os agendamentos disponíveis por falta de demanda. Foi então que o Estado decidiu derrubar os requisitos para a vacinação para que qualquer morador pudesse se vacinar.
Nesta semana, um centro de vacinação em massa foi aberto no distrito de Matanuska-Susitna Borough, nos arredores de Anchorage, maior cidade do Alasca. Profissionais estavam prontos para vacinar mais de mil pessoas por dia. Mas só um terço das doses disponíveis foram aplicadas, segundo a imprensa local. Em outros Estados, autoridades de saúde relatam que os agendamentos não têm mais se esgotado em minutos, como ocorria cerca de um mês atrás. “Considero isso o primeiro sinal de que estamos mudando da urgência para a hesitação”, disse ao Washington Post o diretor do Centro de Controle de Doenças do Estado do Maine, Nirav Shah.
No início, a maior preocupação das autoridades americanas era a desconfiança entre a população negra. Os sinais, no entanto, são de que o ceticismo dos negros com a vacina tem se dissipado. “Alguns estudos sugerem que a desconfiança médica, as crenças religiosas, o preconceito racial por parte de profissionais de saúde, a falta de mensagens claras dos funcionários públicos e as preocupações sobre a segurança da vacina são as razões pelas quais algumas pessoas negras podem ser mais céticas em relação à vacina” , afirma Neblett. “Mas dados mais recentes sugerem diferenças muito pequenas entre negros e brancos.”
Ainda segundo o Pew Research Center, a maioria dos negros (61%) diz que planeja tomar a vacina ou já tomou, uma alta expressiva se comparada com a pesquisa de novembro, quando só 42% planejavam se vacinar. Uma sondagem do instituto Civiqs, conduzida totalmente online, mostra que mais de 60% dos americanos negros responderam que não tomariam a vacina ou ainda não tinham decidido, em setembro. Na semana passada, a proporção caiu para 34%, somando os dois grupos.
Trump terá papel crucial em convencer os mais céticos
Pesquisas mostram que o maior obstáculo para a imunização coletiva está entre os republicanos – 40% deles dizem que não pretendem tomar a vacina e 15% não têm certeza, segundo o instituto Civiqs. Na sondagem do Pew Research Center, 56% dos republicanos disseram que pretendem se vacinar – menos do que em 2020, quando eram 65%. Entre os democratas, o apoio à vacina subiu de 79% para 83%.
Na terça-feira, o ex-presidente Donald Trump deu entrevista à jornalista Maria Bartiromo, da Fox News, emissora preferida do eleitorado republicano, para pedir a seus apoiadores que confiem na vacinação. Trump negou a gravidade do vírus enquanto esteve na presidência, mas apostou nas vacinas ao bancar a compra de milhões de doses ainda no início da pandemia.
Durante o ano de 2020, o então presidente minimizou os efeitos da doença e rejeitou endossar medidas de controle do vírus. Apoiadores de Trump se recusavam a usar máscara de proteção nos comícios do presidente, aglomerados para ouvir o republicano falar. A entrevista de Trump é uma tentativa de estimular seu eleitorado, que agora ameaça a imunização em massa. “Eu recomendaria e recomendaria para muitas pessoas que não querem tomar (a vacina)”, disse Trump.
Uma forma de contornar a resistência seria a obrigatoriedade da vacina. Os Estados podem torná-las compulsórias, segundo precedente de 1905 da Suprema Corte. Na época, um morador de Massachusetts se recusou a receber a vacina contra a varíola, obrigatória no Estado sob pena de multa de US$ 5. O tribunal entendeu que os direitos individuais podem ser limitados para garantir a segurança coletiva.
Mas tornar a vacina obrigatória não é uma ideia vista com entusiasmo pelos infectologistas da Casa Branca. O mais provável é exigir a vacinação para determinadas atividades, como já existe hoje. Crianças, por exemplo, precisam estar com a imunização em dia no momento da matrícula. A exigência, porém, só pode vir após a vacina estar disponível para todos – o que ainda não é o caso. “Não é hora de falar sobre isso agora, enquanto ainda temos uma grande demanda que supera a oferta”, disse Anthony Fauci, principal infectologista do governo. // Fonte: Estadão.
Fonte: Brazilian Press