EUA: Crianças migrantes detidas são mantidas em péssimas condições, dizem ativistas

Uma cena caótica de doença e imundice está acontecendo em um posto superlotado em Clint, Texas, onde centenas de jovens que acabaram de cruzar a fronteira com os EUA estão detidos, denunciam advogados que visitaram o local esta semana. Algumas crianças estão lá há quase um mês. Crianças com apenas 7 ou 8 anos, muitas delas vestindo roupas cobertas de catarro e lágrimas, tomam conta de outras mais novas que acabaram de conhecer , contam os advogados. Bebês sem fraldas se aliviam nas próprias calças, e mães adolescentes têm suas roupas manchadas com leite.

A maioria dos jovens detidos não pôde tomar banho ou lavar as roupas desde que foi levada ao local, dizem os visitantes. As crianças também não têm acesso a escovas de dentes, pasta ou sabão. — Há um fedor que se espalha — diz Elora Mukherjee, diretora da Clínica para Direito dos Imigrantes da Escola de Direito da Universidade de Colúmbia, uma das advogadas que visitou a instalação. — A grande maioria das crianças não toma banho desde que cruzou a fronteira.

As condições das instalações do Serviço de Proteção Alfandegária e de Fronteiras dos EUA ao longo da divisa com o México têm sido alvo de crescente preocupação das autoridades, que alertam que o grande influxo de famílias de imigrantes levou os locais para além de sua capacidade. Em maio, o inspetor geral do Departamento de Segurança Interna dos EUA destacou a “perigosa lotação” de imigrantes adultos mantidos em um centro de processamento em El Paso, onde até 900 pessoas estão detidas em um local desenhado para abrigar 125. Em alguns casos, celas destinadas para 35 pessoas estão mantendo 155.

“Agentes da Patrulha de Fronteira nos disseram que os detidos estão sendo mantidos em quartos onde são obrigados a ficar de pé por dias ou semanas”, informou o escritório do inspetor geral em seu relatório, que destacou que alguns detidos foram vistos de pé sobre os vasos sanitários das celas “para dar lugar e espaço para respirar, e assim limitando o acesso aos banheiros”. O governador do Texas, Greg Abbott, anunciou na sexta-feira a mobilização de mil soldados da Guarda Nacional na fronteira para ajudar a receber a contínua onda de imigrantes, que ele diz ter chegado a mais de 45 mil pessoas de 52 países apenas nas últimas três semanas.

— A crise na fronteira Sul é diferente de tudo que já vimos antes e está impondo enorme pressão sobre os recursos que temos no local – disse Abbott, acrescentando que o “Congresso é um grupo de patifes por não agir quanto à crise em nossas fronteiras”. O fluxo de pessoas cruzando a fronteira para ter diminuído nas últimas semanas, possivelmente em resposta à ação do governo do México sobre pressão do presidente President Donald Trump, mas seus números permanecem altos quando comparados com os de anos recentes. Mas a crise de superlotação tem se dado praticamente invisível, com jornalistas e advogados tendo pouco acesso aos postos de fronteira cercados.

Relatos de condições inseguras e degradantes em Clint e outros locais estão chegando dias depois de advogados do governo argumentarem em tribunal não terem a obrigação de fornecer sabonete ou escovas de dentes sob força de acordo legal que deu a Mukherjee e seus colegas acesso ao posto. O acordo é resultado de processo primeiro mediado em 1997, no qual foram determinados os padrões para detenção, tratamento de liberação de migrantes menores de idade postos sob custódias das autoridades federais de imigração.

Em razão do acordo, Mukherjee e equipes de advogados têm durante anos inspecionado os postos do governo onde as crianças imigrantes são detidas. Ela e seus colegas viajaram para Clint esta semana depois de saberem que os oficiais de fronteira começaram a levar para o local menores que tinham acabado de cruzar a divisa por lá. Segundo Mukherjee, as condições que ela encontrou em Clint são as piores que já viu em qualquer lugar que tenha visitado em seus 12 anos de carreira. — Muitas crianças estão doentes, gripadas, e não estão sendo tratadas adequadamente — contou. A agência de notícias Associated Press obteve e divulgou na quarta-feira um censo das instalações de Clint, que abriga três bebês, todos com suas mães adolescentes, junto com outro bebê de um ano, dois de dois anos e mais um de três anos, além de dezenas de crianças com menos de 12 anos.

Mukherjee diz que as crianças estão sendo vigiadas por gurdas do Serviço de Proteção Alfandegária e de Fronteiras, que declinou pedidos de comentários a esta história. Ela e seus colegas também destacam que os guardas usam uniformes completos, incluindo armas, bem como máscaras para se protegerem das péssimas condições sanitárias. O grupo de seis advogados se encontrou com 60 crianças em Clint esta semana, com idades que variavam de 5 meses a 17 anos. Alguns dos bebês eram filhos de pais e mães menores, que também estavam detidos no local. Outros, porém, foram separados dos adultos de suas famílias com quem cruzaram a fronteira. Estas crianças estão agora sozinhas, sob os cuidados de outros jovens também detidos.

— As crianças ficam trancadas em suas celas ou gaiolas quase o dia inteiro — relata Mukherjee. — Algumas poucas crianças dizem ter a oportunidade de sair e brincar um pouco, mas contam que não conseguem se divertir porque estão simplesmente tentando se manter vivas lá . Quando os advogados chegaram, os agentes federais disseram que mais de 350 crianças estavam detidas nas instalações. Eles não informaram qual a capacidade do local, mas admitiram que o número de detidos já a superou. Quando os advogados foram embora na quarta à noite, eles relataram que cerca de 200 das crianças tinham sido transferidas para outro local, mas não disseram para onde elas foram mandadas.

— Isto está me deixando sem dormir à noite — comentou Mukherjee. Algumas das crianças doentes estão sob quarentena nas instalações. Os advogados puderam falar com as crianças por telefone, mas seus pedidos para se encontrar com elas pessoalmente e observar as condições que estão sendo mantidas foram negados. As crianças contaram aos advogados receberem a mesma refeição todos os dias — mingau instantâneo de café da manhã, macarrão instantâneo de almoço e um burrito congelado de jantar, junto com alguns biscoitos e sucos em caixinhas —, o que muitas dizem não ser o bastante. Algumas contaram aos advogados acordarem no meio da noite com seus estômagos roncando de fome. — Todas as crianças recebem a mesma coisa, quer tenham um ano ou 17 anos — critica Mukherjee. — Quase toda criança com quem conversei me disse estar com fome.

Fonte: Brazilian Press