Justiça dos EUA barra programa de Trump que devolvia imigrantes ao México

Um tribunal federal de apelações dos EUA barrou, nesta sexta-feira, um pilar central da agenda anti-imigração do governo de Donald Trump, o Protocolo de Proteção aos Migrantes (PPM). Conhecido como “Fique no México”, o programa forçou, desde janeiro de 2019, dezenas de milhares de migrantes a aguardarem no México por audiências nos tribunais de imigração dos EUA.

Desde que as novas restrições foram implementadas, mais de 59 mil solicitantes de refúgio foram devolvidos pelas autoridades americanas às cidades fronteiriças do México. Pelo menos 35 eram brasileiros, dentre eles quatro crianças. Desse total, apenas 0,01% teve seu pedido de asilo aceito, o que representa um contingente de apenas 130 pessoas, segundo um levantamento da Universidade de Siracusa. Na decisão desta sexta-feira, os juízes afirmaram que a política deve ser “invalidada na sua totalidade” por estar em conflito com o “propósito das leis de imigração dos Estados Unidos”. O governo Trump alega que o programa não viola nenhum princípio do direito internacional, já que os imigrantes podem dizer às autoridades, a qualquer momento do processo, que temem retornar ao México. Autoridades também afirmam que forçar os migrantes a esperar no México é uma maneira de reduzir pedidos fraudulentos de asilo.

— É uma rejeição retumbante — afirmou Judy Rabinovitz, da União Americana pelas Liberdades Civis (ACLU). — A política é uma vergonha, é ilegal, é moralmente indefensável e precisa parar. É esperado que o governo recorra da decisão na Suprema Corte dos EUA, como fez em outras decisões. O destino reservado a essas pessoas era uma longa espera — por meses, às vezes um ano inteiro — em albergues ou campos improvisados, onde é preciso viver, na maioria dos casos, em condições insalubres, sem o mínimo necessário. Os imigrantes, muitos deles crianças, também enfrentam violência em perigosas cidades fronteiriças. Pelo menos 1.000 pessoas devolvidas pelo programa foram atacadas ou ameaçadas no México, de acordo com um relatório da Human Rights Watch de fevereiro que documentou sequestros, estupros e agressões.

Na cidade de Matamoros, onde centenas de imigrantes centro-americanos chegam à ponte internacional que separa o estado de Tamaulipas, no México, do estado do Texas, a situação é precária: alguns poucos banheiros e chuveiros foram instalados pelo Instituto Nacional de Migração, mas não há controle do uso; água e comida são distribuídos gratuitamente, mas dependem do esforço de voluntários americanos e entidades religiosas, em geral; o único serviço de saúde disponível é o fornecido pela organização Médicos Sem Fronteiras. — Em todos os níveis, é o oposto de proteger as pessoas — disse ao New York Times Karen Musalo, advogada e professora da Faculdade de Direito da Universidade da Califórnia. — É realmente colocá-los em tão grande risco.

Quase um milhão de imigrantes detidos

Em uma decisão separada, o mesmo painel de juízes do Tribunal de Apelações rejeitou, também nesta sexta-feira, outra tentativa do governo Trump de restringir o asilo. Nesse caso, os juízes revisaram uma política que impedia qualquer pessoa que tenha entrado ilegalmente nos Estados Unidos de solicitar asilo. O tribunal considerou que a norma também é contrária à lei de asilo, que determina que as pessoas podem solicitar o status independentemente do local onde entrem no país. — O que é especialmente significativo é que, em ambos os casos, o tribunal considerou que o governo ignorou o Congresso — afirmou Lee Gelernt, vice-diretor de direitos dos imigrantes da ACLU. O número de imigrantes detidos na fronteira sul dos EUA chegou a quase um milhão no ano fiscal de 2019, quase o dobro do período anterior, o que gerou fortes tensões entre Washington e os países ao sul — principalmente México, Honduras, Guatemala e El Salvador — que foram forçados a assinar acordos para reduzir o fluxo. Já o número de brasileiros presos tentando entrar irregularmente nos EUA aumentou em mais de 10 vezes no ano fiscal de 2019, para cerca de 18 mil, muito acima dos aproximadamente 1.600 detidos no ano anterior, de acordo com o Serviço de Alfândega e Proteção de Fronteiras.

Fonte: Brazilian Press